Blue Light

Ana Blue

Blue Light

O que dizer dessa pessoa que a gente mal conhece, mas já considera pacas? Ana Blue não tem partido, não tem Tinder, é fã de Janis Joplin, parece intelectual mas tem vocação mesmo é pra comer. E divide a vida dela com você, todo sábado, no Blue Light.

18/03/2016

João Clemente, bem aqui na mesa da frente, enquanto eu rabiscava ideias para o caderno, conseguiu transformar em uma frase simples todo o meu sentimento do momento: ter que ‘dar certo na vida’, principalmente a financeira, deprime.

Se o meu dinheiro falasse, diria: ‘Fui!’.

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29/02/2016

Me mandou comprar um pacote de pregos na São José. Eu não acreditei quando vi as moedas de um real e as duas de 25 dispostas quase simetricamente na minha mão magrinha. Costume da casa: nada que vinha dela ficava desalinhado.

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12/02/2016

A japonesinha, 15 anos de idade no máximo, acredito eu, samba feito gente grande numa das alas da escola de samba que desfila à minha frente. Aliás, uma cena comum até essa altura do desfile: crianças, muitas crianças e muitos jovens na avenida. A impressão constante no ar é de que os foliões de Friburgo ainda fazem carnaval à moda antiga, com confete e serpentina pra todo lado — ainda bem. Vê-se mais crianças do que bundas se remexendo. Na segunda fila, atrás da japonesinha, uma outra japonesa, mais velha e com ares de síndica, dança e se sacoleja ao som do samba-enredo.

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30/01/2016

Uma vez mais estou eu aqui, sentada no banco da praça às cinco da tarde. Distraidamente disputando espaço na sombra com meninos do tráfico, velhinhos e prostitutas. Por que toda praça de cidade grande é cinza e cheia de gente cinza, suas vidas cinzas como o chão que pisam? Nem sei de onde tirei a ideia besta de não viver no verde-mato que viu nascer. Eu queria palcos e shows de luzes, cidade grande, estudar poesia, mas ainda na rodoviária urbana pude ver a fumaça industrial gritando que isso aqui não era o meu lugar. Mas eu não podia voltar quando tinha pra onde.

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22/01/2016

Filho é novela. Toda vez que lembro de uma história, lembro o dia inteiro dessa história, às vezes com detalhes ricos como roupas e cortes de cabelo da época.

Um dia, por exemplo. O menu era angu com caldo de carne. Gui estava no carrinho, tal passarinho de bico aberto, se alimentando da minha grande fonte de fubá Granfino cozido. Mamãe dizia pra colocar o cinto do carrinho pra firmar o menino, sabe como é mãe, acha que o filho é pequeno pra sempre. Eu achava ele muito pequeno pra cair do carrinho, minha mãe me achava pequena demais pra cuidar dele.

Nós duas erramos.

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18/01/2016

Hoje é a segunda-feira mais triste do ano e embora tenha sido um dia triste como um todo eu só fui saber que é reconhecida oficialmente como tal agora à noite. Daí deu vontade de despejar em qualquer uma rede social da vida um manifestozinho de ódio às nações, de clamor aos patrões, de dane-se aos espertalhões. Sei lá. Em que momento, exato, entre o passado e o presente, entre as crianças fofas que éramos e este adulto sem explicação que somos hoje, nos tornamos este ser que precisa postar vídeo, letra, música e poesia inconveniente para atingir aquela outra pessoa, entidade, nação?

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15/01/2016

Conheci Joelma num ponto de ônibus, chovendo, lá pelos anos 90, quando eu ainda colecionava tazos e figurinhas dos Mamonas Assassinas. Eu era uma jovem artistinha de teatro mambembe cheia de futuro pelas costas e fui apresentar uma peça de Natal que já nem lembro se eu era Mãe de Deus ou Madalena e repito isso vida afora. Tenho sido bastante Madalena mas graças a Deus ninguém assiste e quando sou Nossa Senhora acham graça. Fato é que depois da peça, ao ir embora, conheci Joelma, 17 anos, poliomielite.

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12/01/2016

O tempo passa muito devagar até a gente fazer 18 anos e poder entrar na boate de cabeça erguida e documento verdadeiro. Passa peculiarmente devagar nos dias que antecedem o salário. Ou na frente de uma tela esperando mensagem. Passa devagar na missa, nos pênaltis, na fila, no ponto de ônibus, no banco. No banco, então. Dessa cena eu lembro até o cheiro de alfazema/naftalina. Vejo agora mesmo na minha sala dezenas de velhinhas sendo atendidas pelo Posso Ajudar? da Caixa Econômica Federal. O tempo passa muito devagar às vezes. E também rápido, muito rápido.

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28/11/2015

Outra vez pizza dura e borrachuda. Qual a dificuldade de lembrar de apagar o forno antes de o queijo virar uma borracha? Queria o quê? Fazer valer o trabalho que dá pra acender? Não bastasse o cenário de guerra em volta, as contas atrasadas, os papéis amassados de Sensação, a garrafa de guaraná sem gás quase virando em cima do carpete. Precisava, além de tudo, comer mal e porcamente. Viver mal e porcamente. Dormir outra noite no sofá. Mais uma vez pizza, mais uma vez Facebook até tarde, mais uma vez Jô Soares.

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16/11/2015

Se eu apertar bem os olhos, aliás, nem precisa ser tão bem apertado assim, eu consigo lembrar com precisão parnasiana da cara de sonsa da moça loira no ponto de ônibus. Vaca — não tenho outra explicação.

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