Essa semana, dia 5, foi Dia Nacional da Cultura — e bem que eu gostaria de ter comemorado. A data, escolhida em razão de ser o dia de nascimento de Ruy Barbosa, uma das maiores personas do Brasil, inclusive figurinha carimbada em terras friburguinhas, é só mais uma de tantas datas que celebram algo sem sentido prático ou real, tal qual o natal ou o dia dos namorados: celebra-se o protocolo da homenagem, mas se esquece do personagem central da dita-cuja.
Blue Light
Ana Blue
Blue Light
O que dizer dessa pessoa que a gente mal conhece, mas já considera pacas? Ana Blue não tem partido, não tem Tinder, é fã de Janis Joplin, parece intelectual mas tem vocação mesmo é pra comer. E divide a vida dela com você, todo sábado, no Blue Light.
Eis que é chegada a última semana desse mês de outubro que teve quinhentos dias além do calendário oficial. Entre a pretensa proibição da pílula do dia seguinte, a Valentina, a redação do Enem e o sábado de dia das bruxas, muita coisa aconteceu nesse Brasilzão. Tudo constatando uma verdade: mulher nasceu mesmo predisposta a ir pra fogueira.
Acabei de alterar a primeira frase do texto de hoje. O que eu tinha pensado antes vai virar introdução do terceiro parágrafo. Porque às vezes estou escrevendo algo bonito e cheio de vida, mas aí passa um vento e paralisa a minha cara, eu bato o dedinho numa quina de móvel, gripo, levo um coice de uma mula, atropelo um ciclista, encontro um credor, sei lá, acontece qualquer um desses imprevistos que tiram todo o brilho da gente. Aí, o que que eu ia dizer mesmo? Os dias são tomados de um véu negro de repente. Eu ia falar dos lindos olhos de Julia, filha da Dalva?
Diz Fabricio Carpinejar que para o amor, banco de praça já basta e eu concordo plenamente. Amores que não passeiam nas praças não são amores, são apenas conexões mal encaixadas, que se esgarçam com o tempo. Acasos, ânsias, falhas nas nossas Matrix sentimentais. O amor, não. É idealista de nascença e de morrência. Enxerga só o que quer. Come só o que quiser. E anda, passeia (mãos dadas) na praça: casquinha de Mc Donalds, hippie vendendo brinco, cocô de pombo na mochila nova, paciência. Amor é banco de praça.
Abro o facebook pelo celular logo cedo, como todos os dias (ou pelo menos até quando a internet aberta da rua funcionar lá em casa). E entre as frases bonitas das moças bonitas nas academias e as crianças despedaçadas que os desavisados teimam em compartilhar e as rejeições acaloradas ao governo do PT, me deparo com o status de Kayte falando sobre as milhares de pessoas pobres vitimadas pela violência todos os dias no Brasil e que não estampam as capas dos jornais, ao passo que a classe média, quando tem uma vida ceifada pelo crime, vira assunto de programa de televisão.
É uma pena que os bares tenham morrido. As famílias do estatuto agradecem, mas a verdade é que os bares eram ambientes muito mais legais antigamente. Ou nem tão antigamente assim: pelo menos pra minha geração, que aos vinte e poucos anos queria ser trinta e agora depois dos trinta quer voltar aos vinte e poucos. Estamos falando de um espaço de tempo curto, quinze anos no máximo, entre o tijolão, o Nokia de cobrinha e o iPhone que custa o preço de um carro usado popular. Em dez anos evoluímos nosso aparato digital tanto quanto atrofiamos a capacidade mental, cognitiva, comportamental.
Eu tenho crises de pânico e peço, por um momento, que todas as mães se reconheçam.
Eu quis fazer parte de um fã clube de Sandy & Júnior, porque não entrava na minha cabeça gostar de alguém que não sabia que eu existia. E chegar aos ídolos, naquela época, só pagando mensalidade de fã clube. A dupla foi o meu último suspiro de infância, por obra e graça divina das fitas K7 que insistentemente ganhei aniversário após aniversário, natal após natal. Acho que acompanhei a carreira deles até ela fazer par romântico com Paulinho Vilhena.
A peregrinação constante rumo às missas da Paróquia de Santa Teresinha me reservou boas descobertas gastronômicas numa época em que engordar era a menor das minhas preocupações. Desde o trailer de aparência desleixada, mas misto quente maravilhoso da praça de Conselheiro Paulino até o pão fresquinho da antiga Padaria Matinal. O Fruit Mel, um fandanguinho doce que só encontro numa bomboniere de lá. Até em dias de festa e barracas mais pomposas, como a de Folia de Reis ou a própria festa da santa mais amada do bairro, nossa preferência sempre pesava para o lado do trailer feioso.
Você sabe quando está prestes a fazer a maior besteira da paróquia. Sempre sabe. Algum fio de nylon invisível liga todas as tormentas possíveis de acontecer na sua vida e você tropeça nesse nylon toda hora. Tem algo que te puxa, que te prende. E você vai, claro. Eu aposto que você não se lembra da primeira vez que comprou Yakult naquela padaria. E você compra há muitos anos, é um relacionamento especial. Eu aposto que você não lembra se o cobrador do ônibus que você pegou de manhã tinha um brinco na orelha. E você pega esse ônibus todos os dias.