Presentear é uma arte delicada e milenar. Não se deve presentear por ímpeto, nem baseado no gosto pessoal de quem presenteia. É necessário sentir o outro em seus gostos e expectativas, saber da sua história e compreender seus sonhos. Uma cafeteira pode ser mais significativa do que uma caneta dourada para uma pessoa e, de modo contrário, para outra. Presenteia-se por vários motivos e em datas diversas, dependendo do encontro afetivo que o presenteador quer estabelecer com o presenteado.
Momentos Literários
Tereza Cristina Malcher Campitelli
Momentos Literários
Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.
O aplicativo Netflix ganhou a atenção do planeta porque todos nós gostamos de cinema e de acompanhar a sequência de histórias, como acontece nas novelas. Talvez porque estamos mergulhados na realidade existencial e queremos de ter contato com o desencadeamento de fatos que não protagonizamos, escutando narrativas de pessoas ou assistindo filmes e séries.
Nesta quinta-feira, 25 de julho de 2019, o céu está desenhado com esparsas nuvens brancas, que vagabundeiam num azul profundo e silencioso, como observou Rubem Braga, certa vez, deitado em sua rede. O céu dele era o de Ipanema, e o meu, agora, é o de Nova Friburgo. Tal vagar inspira-me ainda mais para escrever a respeito do dia de quem escreve, até porque é justo fazer uma reverência a um trabalhador que tem como profissão o uso da palavra. Acredito que esteja na palavra o maior poder existente no mundo.
Depois de todos os problemas resolvidos, durante uma tarde livre, aquela que oferece um pouco de tempo ocioso, é precioso para a leitura. Ler com prazer, sem aquela agonia de não deixar que caiam as coisas penduradas na agenda. Um tempo para degustar as passagens de uma história, quiçá entremeá-la com outras, o que depende da personalidade do leitor. Quer dizer, daquele que está por ora desavisado do mundo, um tanto desligado das responsabilidades e pronto para degustar um texto, seja ficcional ou não.
Na semana passada, fui ao Colégio Estadual José Martins da Costa conversar com
os alunos a respeito da literatura fantástica ao lado da escritora Ana Beatriz Manier, da
historiadora Maria Janaína Botelho e da editora Amanda Lobosco. A sala estava lotada
de alunos e professores que demonstravam interesse por esse gênero literário que
emerge do universo fantasioso, cujas histórias podem ser criadas ou estar relacionadas
a fatos narrados sem comprovação da veracidade dos acontecimentos. O crivo de
Pouco antes de começar a escrever esta coluna, tive o conhecimento da morte de João Gilberto, o gênio da bossa nova, estilo musical que marcou época no Brasil e tocou o mundo.
A meu ver, seus músicos foram menestréis. Criaram uma canção que se canta com o coração, não somente pela melodia, mas pelas letras, tão românticas e poéticas, que expressam a simplicidade do amor e da vida. Da brisa de Ipanema.
Não existe terapia mais eficiente do que escrever memórias. Não tenho dúvidas de que escrevê-las é o mais complexo dos desafios. Até inspirada em Saint-Exupéry, considero que é mais fácil contar a história de outros ou inventá-las do que contarmos a nossa própria porque as lembranças envolvem observações, avaliações críticas e argumentações. As boas lembranças não são parques de diversões; pelo contrário, são belas e tristes, interessantes e trágicas, inusitadamente corriqueiras e severamente trágicas. Revelam nossa humanidade tão imperfeita quanto os traços dos quadros de Jean Miró.
Ainda estou envolvida com a palestra do O Pequeno Príncipe, que acontecerá no dia 29 de junho de 2019, às 15 horas, na Academia Friburguense de Letras, durante a Feira de Livros do Anexo Jovem. Não me parece estranho um autor e uma obra tomarem conta de um pensamento por tanto tempo, através de pesquisas, leituras, reflexões e anotações. A pesquisa faz o passado vivo e permite-nos um olhar distanciado, possibilitando-nos deslizar em dimensões temporais e geográficas distintas, em avaliar pontos de vista diversos.
Está na literatura fantástica um grande desafio ao escritor: não ter medo de imaginar. Parece incrível fazer tal afirmação, mas quem não tem medo de refletir? Quem ainda não sofreu com uma ideia ou modos de pensar?
Então, o que se poderá dizer com o imaginar?
A arte literária se justifica pela fusão do escritor com sua obra através de
uma particular intimidade: a obra revela a essência do autor e da sua história
de vida na medida em que o autor estende seu corpo, mente e espírito para as
palavras empregadas em cada produção literária. Seus braços crescem. O
ineditismo da obra está relacionado com a motivação intrínseca do escritor em
construí-la.