Palavreando

Palavreando

Aos sábados, no Caderno Z, o jornalista Wanderson Nogueira explora a sua verve literária na coluna "Palavreando", onde fala de sentimentos e analisa o espírito e o comportamento humano.

30/10/2019

A vida, se estiver atento, nos dá a possibilidade de fazer viagens incríveis sem pegar ônibus, trem, carro ou avião. Viagens sem sequer sair do lugar. Descobre-se então que a melhor viagem que se pode fazer é nas pessoas.

Elas chegam com suas bagagens. Nós estamos ali, com nossas tralhas. Se tivermos peito aberto, a viagem então começa e pode ir longe, muito longe... Para a vida inteira, quiçá para a eternidade.

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05/10/2019

Uma fênix. Um cavalo. Um cavalo montado. Um pônei. Não, um cavalo alado. Um dragão. Solta fogo. Uma serpente. Um dinossauro. Dinossauro? Onde? À esquerda. Ah! Há que se ver mais amplamente. Sim! Um dinossauro. Um Brontossauro? Tiranossauro, não? Um velociraptor. Bem maior. Esse é grande! Um velociraptor grande! Lá é um Arqueopterix. Ou será um Cearadáctilo? É um Pteranodonte. É um pássaro mesmo. Se desfaz.

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28/09/2019

Nada mais íntimo do que escova de dente. Uma escova na casa dele, outra escova na casa dela. Invadir com licença total a casa, o quarto, a cama, a vida do outro que já não é um outro qualquer. É quem faz brilhar os olhos e consome prazerosamente as horas do dia. No pensamento, nos planos, na nostalgia... No desejo de ver, ser, estar.  

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21/09/2019

Fui assaltado. Roubaram-me o cordão de ouro que estava em meu pescoço. Enquanto eu, na paz, vislumbrava o mar trocando ideias com dois amigos, arrancaram o laço do meu pescoço ao ponto de marcar a minha pele. Não era importante por ser de ouro. Seu valor era sentimental, por isso incomensurável. Foi um presente de minha mãe há mais de dez anos. Pela última década não houve um dia que eu o tenha tirado do pescoço. Era quase parte de mim.

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14/09/2019

Como se sente? Pergunta feita, na maioria das vezes ou quase sempre, por mera educação. A pergunta que se faz para puxar papo com a previsão de que a resposta será também meramente protocolar: “tudo bem. E, você?”. 

Talvez, em verdade e com raras exceções, não perguntemos com a convicção de quem está mesmo preocupado em saber a resposta. Até porque, nesse mundo corrido, mas em que o relógio continua girando na mesma velocidade de quando foi inventado, nós mesmos não nos perguntamos: “como se sente?”

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07/09/2019

Eu não tenho bichinho de estimação, mas estimo quem tem. Minha saudosa mãe diria que não sei cuidar nem de mim mesmo, quem dirá de um cãozinho. A verdade é que, por altruísmo ou beleza semelhante, o dono de um gatinho cuide melhor dele do que de si mesmo. Cuidar de um bichinho pode ser, no final das contas, cuidar de si mesmo. Terapia.

Mas há nesse encontro, uma relação profunda, repleta de afeto e humanidade, ainda que não seja entre dois humanos. No caso de algumas pessoas especiais, é mais do que entre dois, é entre um humano e inúmeros bichinhos.

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31/08/2019

Eu não tenho todas as respostas. Não por falta de procura. Acho que todo mundo, ao menos uma vez, quer respostas, certezas, garantias. Eu não sei, simplesmente não sei.

Admito que não sei muito acerca do passado, tampouco muito do presente e absolutamente nada sobre o futuro. Não que não soubesse ou não quisesse saber. Não que eu não tenha aprendido ou que não quisesse aprender. E a vida é sempre esse mar de incerteza em busca da certeza da praia, da segurança da areia, da praticidade da costa que tudo margeia e que traça limites. 

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24/08/2019

São Francisco já dizia há muito tempo: “Onde houver ódio, que eu leve o amor. Onde houver ofensa, que eu leve o perdão. Onde houver discórdia, que eu leve a união”. A belíssima oração é até canção. Mas muitos cantam sem senti-la, muitos fazem dela sua reza, mas nem ao menos tentam praticá-la. Aí, de nada vale sua beleza. Palavras ao vento. Tampouco se aprende com ela quando apenas a boca profere, mas o ouvido não ouve e o coração não sente.

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17/08/2019

Vivo num tempo de saudades. Saudade de minha mãe, do meu pai, dos amigos mestres, dos amigos irmãos. Tenho saudade de quando era criança, mesmo que tenha sido difícil a minha infância. Talvez seja saudade daquela pureza de quem não sabia propriamente definir mazela. 

Tenho saudade daqueles momentos típicos que entram na biografia. E não imagine que é saudade de grandes vitórias ou acontecimentos. Esses também entram, mas não são necessariamente dos que sinto mais saudade. 

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10/08/2019

Pai, tenho sentido falta da sua voz. Temo por estar quase a esquecendo. Dizem que a voz é um dos primeiros esquecimentos que se tem, quando se perde alguém. Mesmo que tenha se tornado mais difícil a cada ano lembrar com exatidão o timbre, as pausas, a sonoridade quase arrastada, sei que ainda me fala... 

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