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Sheik e o Pintinho Maluquinho
Eu não tenho bichinho de estimação, mas estimo quem tem. Minha saudosa mãe diria que não sei cuidar nem de mim mesmo, quem dirá de um cãozinho. A verdade é que, por altruísmo ou beleza semelhante, o dono de um gatinho cuide melhor dele do que de si mesmo. Cuidar de um bichinho pode ser, no final das contas, cuidar de si mesmo. Terapia.
Mas há nesse encontro, uma relação profunda, repleta de afeto e humanidade, ainda que não seja entre dois humanos. No caso de algumas pessoas especiais, é mais do que entre dois, é entre um humano e inúmeros bichinhos.
O que há de mais bonito em ter um animal de estimação é o respeito à vida. De qualquer ser. Relembro meu pai. Quando eu era criança, bem pequena mesmo, ele me dizia que era preciso respeitar todos os bichos para não ir para o inferno dos cachorros ou dos gatos. Quem não quer ir para o céu?
No seu jeito peculiar de ensinar o respeito, aprendi desde cedo que tendo ou não um bicho, é preciso cuidar também daqueles que estão abandonados nas ruas e dos que têm dono também. É necessário que cada um de nós rechace maus tratos e proteja os que não têm como se defender.
Na ausência de coragem e até mesmo de tempo para cuidar de um pet, tenho me testado em cuidar de plantas. Vida de solteiro, de viagens e de quem praticamente só vai pra casa pra dormir. Tenho me saído bem na tarefa, ainda que já tenha perdido um lindo Bonsai.
Mas, ganhei um novo. Esse está vivíssimo, uns três meses, e as flores que plantei na jardineira da janela estão coloridas e chamando a atenção de quem passa. Converso com elas. Optei por aquelas que só precisam ser regadas de três em três dias. O próximo passo é uma horta vertical para ter temperos sempre frescos. Minha mãe ficaria orgulhosa de mim.
Na minha infância, acompanhei meu pai com seu galinheiro, seus periquitos e um cachorro. Teve um aquário também. Confesso traumas. O primeiro deles foi com o Pintinho Maluquinho. Eu e meus irmãos lhe demos esse nome porque o pobrezinho nasceu meio manco e com a cabeça um pouco torta, mas era divertido e brincalhão. O carinho por ele era enorme, mas ele viveu apenas umas duas ou três semanas. Foi a minha primeira experiência com a morte. Chorei por uma semana. Nunca mais quis saber de bichinhos de estimação.
O cachorro foi uma situação não planejada. Tanto sua chegada, como sua partida. Sheik era seu nome. Acho que era assim que se escrevia. Um doce vira-lata com traços de pastor alemão. Subindo o morro para casa, estava lá ele, filhotinho, sozinho e cheio de pulgas e carrapatos, à beira da morte. Não havia qualquer intenção de se ter um cachorro, mas cuidamos dele, ficou lindo! Crescido, tinha mania de comer os frangos do vizinho. Foi difícil educá-lo para não cometer tais assassinatos. Foi uma convivência de uns cinco anos, até que um dia, ele simplesmente desapareceu. Procuramos e procuramos e nunca encontramos. Hoje, certamente, está no tal céu dos cachorros.
Bichinhos de estimação nos trazem esse cheiro de infância, esse sabor de saudade. Tem a ver com vida e tudo que ela nos traz, entre elas a morte. Isso me lembra filmes/livros como “Marley e Eu” ou “Quatro Vidas de um Cachorro”. Se não assistiram, recomendo.
Antes de começar a escrever, achei um desafio enorme construir uma crônica sobre bichos de estimação. Será que consigo escrever três parágrafos? Mas quando comecei a digitar, todas essas lembranças vieram à tona, junto com saudáveis lágrimas que me fizeram viajar em tempos que havia esquecido.
A crônica se escreveu rápido e não queria terminar... Mas, fico por aqui, na esperança de que você não se esqueça que a vida de qualquer ser importa e nos traz muita vivacidade... Porque, no final das contas, cuidar de um bichinho de estimação, tem muito a ver com cuidar de nós mesmos.
Palavreando
Aos sábados, no Caderno Z, o jornalista Wanderson Nogueira explora a sua verve literária na coluna "Palavreando", onde fala de sentimentos e analisa o espírito e o comportamento humano.
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