Um zum-zum-zum literário

segunda-feira, 01 de outubro de 2018

A inspiração acontece da forma mais inusitada, até porque não existem
receitas para as ideias surgirem, que, certamente, não brotam com elegância,
nem possuem vozes afinadas. Vivem, dentro de nós, na mais completa
desordem. Nossa mente é multicor, cheia de subterfúgios vivos, com
passagens a outras paisagens. Às vezes, é arejada com ares de Medeia;
outras de Penélope. Nosso pensamento tem caminhos abertos. Livres.
Foi com este movimento mental, sem silêncios e cheios de janelas, que
me deparei com o convite da historiadora Maria Janaína Botelho para escrever,
com ela, a história de Nova Friburgo para crianças, cujo livro seria adotado pela
Secretaria de Educação da cidade. Logicamente, fizemos a nossa versão,
independente.
Como contar uma história de mais de 200 anos? Quem iria contá-la? De
que forma? Ah, decidimos. Será um livro de contos, que nos permitirá melhor
sobrevoar a história de Nova Friburgo.
Quando se escreve um conto, algumas decisões devem ser tomadas
inicialmente, como a definição do narrador e o tempo verbal com que a história
será contada. Ao me deparar com a primeira questão, as ideias fervilharam e
foram surgindo embaralhadas, mas desamarradas entre si. Meu pensamento
galopou e passou por muitas portas. Que narrador será este que viveu 200
anos? Ora, não é fácil construir um narrador, que, na verdade, é a força
decisiva na narrativa.
Depois de um esforço cheio de fios e pontos em cruz, decidi: as
montanhas irão narrar os contos. Foi um entendimento perfeito do modo como
iríamos desenvolver a narrativa, uma vez que os morros, as pedras e os picos
do relevo de Nova Friburgo presenciaram o acontecer da história da cidade. E,
deste modo, começou a nascer “Zum-zum-zum das montanhas: histórias de
Nova Friburgo”.
Assim, tivemos que contar com a colaboração de um geólogo que nos
orientou sobre as características da região. O fazer dos textos nos permitiu

conhecer a grandeza desta parte central da Serra do Mar, um lugar que
guardou tantos sentimentos, sonhos e realizações. Contamos, também, com os
olhos de lince de um grande professor de português para que os textos
respeitassem a nossa língua e de uma escritora e poeta para a estruturação
das histórias e do livro. Logicamente, não poderiam faltar trovas que abrissem
os contos. Foi uma linda e compartilhada aventura literária.
As pesquisas completaram o processo inspirador, que desvendaram com
intimidade este universo geográfico, modificado por tantos nativos e imigrantes,
ao longo do tempo.
Escrevemos um livro de contos sem final porque a história continua a
transformar o ambiente natural e a vida das pessoas, repleta de sementes e
cenas humanas.
Agora, terminado, será um livro cheio de ramas que estimularão o leitor a
continuar a ler e a pesquisar a história deste lugar tão brasileiro.

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Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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