Primavera da humanidade

Pelos próximos meses, a jornalista Laiane Tavares assina a coluna no lugar do titular Wanderson Nogueira. A Justiça Eleitoral determina que candidatos nas Eleições 2018 não podem apresentar, participar ou dar nome a programas de rádio e TV. A regra não se aplica aos órgãos impressos. Mesmo assim, o colunista e A VOZ DA SERRA, em comum acordo, optaram pela alteração neste período. Wanderson Nogueira volta a assinar o Observatório em outubro, após o período eleitoral.

É tempo de florescer para além dos jardins que nos cercam. O que colhemos hoje foi semeado, o que colheremos amanhã também deve ser. O imediatismo da vida tem nos aprisionado no momento, como se nenhuma de nossas ações fosse resultar em algo para além daqui. Mas toda vez que nos movemos, reposicionamos o futuro, e o futuro nem sempre está distante. A incerteza da vida e sua fragilidade faz com que muitas vezes a gente sinta que é preciso reagir com intensidade a tudo, afinal, nunca se sabe o dia de amanhã. Nos tornamos prioridade absoluta, o ‘eu’ está vencendo o ‘nós’ e mesmo quando somos ‘nós’ é contra ‘eles’.

Olhe para o mundo e o veja com seus próprios olhos, não precisa se colocar no lugar de um outro alguém, apenas observe. Você vai perceber que está de um lado, então passe a olhar somente para o seu lado do mundo, dentro dele vai perceber uma nova divisão, fique na parte que lhe cabe desta divisão e ainda sobrarão dois lados, você escolherá um e ele ainda se dividirá, reduzindo as diferenças por um processo de exclusão, em breve estaremos sós. Nesta solidão, olhe para dentro, você também é um universo, e no seu íntimo também coabitam divisões, divergências, batalhas são travadas todos os dias entre você e você mesmo, e ainda assim não é possível seguir abrindo mão de qualquer parte deste todo que te constitui.

Você pode tentar se livrar do que considera um defeito na sua existência, mas cedo ou tarde concordará com o que disse Clarice Lispector “Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro”. A verdade é que nós não precisamos de muito, mas precisamos do todo. Por isso me preocupo tanto com o tipo de solo que estamos semeando neste país.

Haverá sempre duas ou mais formas de perceber o mundo, de viver nele e até de acreditar em uma mesma coisa, e as vezes pode ser insuportável lidar com o outro, mesmo que o meu outro seja diferente do seu, não quer dizer que ele seja menos desagradável, de onde eu olho também o detesto às vezes. Mas não imagino um mundo sem ele.

Às vezes precisamos do outro para enxergar o que não queremos ser, as vezes para perceber que uma outra perspectiva é possível, e até para entender quem somos, o diferente também nos constitui. O que precisamos entender quando falamos de humanidade é que quem é diferente de mim, não me antagoniza por natureza. Se é uma pessoa que está do outro lado, o que nos une deve prevalecer e o que nos distancia deve ser corrigido. Podemos estar em lados opostos, mas não podemos estar em condições desiguais.

Somos todos humanos, nós sabemos. Agora, para impedir que o futuro seja sequestrado e para celebrar a primavera desta humanidade, é preciso reconhecer que embora sejamos todos iguais, não somos tratados como iguais, não desfrutamos dos mesmos direitos e não temos as mesmas chances. Não dá para passar a vida negando a existência do outro, imersos na individualidade de nossas intenções e desejos e ao menor sinal de reivindicação que venha do oposto, levantar uma bandeira que nos identifique como iguais e apenas, quando vivemos de forma tão desigual.

Neste momento estamos mais uma vez semeando o futuro, depois da eleição vem a colheita. Você confia no que está plantando? Mais do que isso, o que você está plantando é seguro para todos nós? Haverá beleza em nossa próxima primavera? É preciso pensar desde já.