Verossimilhança

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Falar de verossimilhança, palavra difícil de escrever e até de pronunciar,
nos exige tempo para compreender o significado que até nos induz a percorrer
a arte de escrever através dos séculos. A começar pelo fato de que as artes,
como o cinema e o teatro, não podem existir se não há um texto literário de
suporte.
A literatura não joga ideias ao léu, emprega a língua na plenitude de seus
sentidos; portanto, requer critérios. Ah, os ideais da liberdade não caem por
terra. Por ser a expressão do imaginário do escritor, não vaga sem rumo nos
bosques da própria fantasia. Se vagar, meu amigo, o escritor fará de tudo,
menos literatura.
O conto e o romance são obras de ficção, mesmo que sejam memória
literária. Este estilo busca retratar os fatos de modo fidedigno, entretanto não
consegue dar conta da realidade em sua total concretude. Até porque o real a
que está fincado é passado, e o escritor produz um texto num momento
diferente, podendo ser, inclusive, instantes posteriores ao acontecido. Além do
que há uma grande distância entre o acontecer e o contar.
O texto de ficção emerge do real. Sim, senhor!, como exclamava Alice. O
imaginário passeia sobre a realidade, e o escritor a observa, seja no presente
ou no passado, e transporta-a ao plano do imaginário. Então, cria enredos, com
personagens, contextos e ambientes seus, totalmente imaginados. Nisso,
Machado de Assis, Dostoievisk e Victor Hugo têm maestria. Souberam penetrar
nas pessoas e nas situações com profundidade e conseguiram tocar na
essência humana. E foram, acima de tudo, perspicazes e sutis.
Na ficção, o escritor inventa uma história, fingindo que está acontecendo
no real. Daí, a importância da verossimilhança. Ou seja, aos olhos do leitor, o
texto possui veracidade; tem tamanha coerência que não contraria ao
acontecer dos fatos.
Noutro dia, estava andando na praça e encontrei o Thales, nosso jovem
escritor, que andava na praça de um lado a outro, dava voltas, sentava nos

bancos, apenas para contextualizar seu conto. Inventado. Quando o li, tive a
sensação que estava lendo o que acontecia na praça.
A ficção literária levanta questões eternas que nunca vão se resolver,
como a de Capitu e Bentinho. Qual o leitor que não guarda essa pergunta ao
longo de sua vida? Quantas obras e argumentos Crime e Castigo não inspira?
E não encontramos com facilidade Jean Vaijean pelas ruas da cidade?

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Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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