O dia em que Deus se ausentou

quinta-feira, 13 de abril de 2017

No céu de estrelas de outubro, exatamente no mesmo teto azul de julho, tudo parou. Tudo, absolutamente, tudo paralisou. As borboletas dos campos sem flores; os discursos que disparam balas nas favelas; as ondas dos mares do Pacífico e do Atlântico; os braços abertos para outros abraços; os icebergs que viajam para encontrar seus Titanics; os lápis dos dedos dos analfabetos funcionais e dos que não sabem escrever o que ditou o amor. Tudo simplesmente parou. O que é bom e ruim. O que é aceito e o que não é aceito. Sem virtudes ou pecados. Sem absolvições ou condenações.  

Quando Deus se ausentou, nem houve a pergunta sobre por que Ele se ausentou. Como se ausentou. A paralisia também cessou os lábios, as palavras, os sentimentos que reavivam e os que corroem também.  

Perguntamos tanto onde está Deus. Procuramos nos céus, para além da Via-Láctea, para o centro da Terra. Vasculhamos nos textos antigos e até na física quântica. Mas não olhamos para dentro. Dentro de nós e na soma de todos nós - Ele. Esquecemos de perceber que Ele está em nós, por nós, entre nós, somos nós na tarefa de desatar os nós.

Quando paralisamos, Deus se ausenta. Não é Deus que erra. Somos nós! 

Quando Deus se ausentou, o relógio parou às 23h59 daquele dia. O fim do mundo não veio no dia que Nostradamus teria previsto. Os polos terrestres não derreteram, tampouco bolas de fogo caíram nas nossas cabeças e dos gados também. Os buracos negros das galáxias não se alimentaram de nossos corpos, nem extraterrestres escravizaram a humanidade. Tudo simplesmente parou. Pausa. Para os que pecam e para aqueles que acusam os pseudo-pecadores. Na paralisia, nem vilões ou heróis. Todos plenamente iguais, preservadas intactas as suas essências que unidas constroem o coletivo de individualidades.

Mas a história do tempo fez todos esquecerem. E o tempo, para todos parou. E, na paralisia de quem não vê, forçou-se a mudez, o congelamento dos membros, a surdez. Só o coração manteve-se comprimindo e exprimindo. Ninguém morreu. Todos percebem a presença da ausência ao parar... O completo que vem do vazio. Forçados a parar para sentir? Sentir se partir para tomar partido. No dia seguinte ao sem Deus, surgirão todos nós. Porque sem nós, não há Deus. 

Já são zero hora e um minuto. Teremos desatado os nós? 

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Wanderson Nogueira

Wanderson Nogueira

Observatório

Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e agora é deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna diária.

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