A dor emocional na criança

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Os primeiros anos da vida de uma criança são fundamentais para promover uma estrutura emocional que a ajudará ou a prejudicará na vida adulta. Se considerarmos que não existe nenhuma família com funcionamento afetivo perfeito, temos que admitir que todas as crianças possuem algum tipo de perda ou falta emocional, com consequências que trarão para a vida adulta manifestadas por sintomas, e no jeito delas de ser.

A gente se torna aquilo que nos causa menos dor. A criança desde pequena vai sendo moldada fazendo escolhas inconscientes em seu psiquismo, para se ajeitar numa forma de ser que ela consegue, visando ter menos sofrimento. A fuga do sofrimento pode levar ao encolhimento do ser, porque você pode desistir de uma parte de sua maneira de estar, ser e funcionar na vida ao vir descobrindo que, se não fizer isto, será pior.

O pai ou mãe, ou ambos, podem, consciente ou inconscientemente, prejudicar ou favorecer este encolhimento pela dificuldade de lidar emocionalmente com o filho durante a infância.

É verdade que o que produz o encolhimento do jeito de ser para cada pessoa conseguir ser o melhor que ela pode, não é somente uma consequência da conduta dos pais ao longo da infância. Há também os fatores genéticos, epigenéticos, e o próprio jeito da criança ser, chamado de “traço”.

Cada criança tem uma sensibilidade emocional diferente da outra na mesma família. Um mesmo evento traumático atinge as crianças de uma mesma família de forma diferente. Algumas crianças sofrem mais do que outras quanto ao mesmo problema por serem mais sensíveis e vulneráveis.

Criança tem angústia e tem depressão. Geralmente ela manifesta isto pelo comportamento que pode ser hiperativo, lento, superobediente, com fobias (medos exagerados), angústia de separação ou sintomas físicos.

Temos que ter cuidado quanto a querer dar remédios para “acalmar” ou “animar” as crianças. E também para adultos! As pessoas estão muito medicadas.

Este exagero deve-se a causas diferentes. Pode ser o pai/mãe que desejam que um médico passe um remédio para o filho “nervoso”, “triste”, “agitado”, sem considerar as causas deste comportamento nele. Sintomas nas crianças refletem o que está ocorrendo na dinâmica da família. Não se deve levar a criança a um profissional em saúde mental e tirar o corpo fora como se o sofrimento dela fosse separado de tudo o que ocorre no lar e na escola.

O sofrimento é inerente à vida humana. Mas uma pergunta nem sempre fácil de ser respondida é: que sofrimento que uma criança, adolescente, adulto ou idoso experimenta e que necessita tratamento? Sentimentos de tristeza, angústia, medo, irritação, perda da esperança precisam ser medicados? Quando?

“O humor depressivo pode ser consequência de um evento vital ou pode representar uma resposta habitual de uma pessoa com uma personalidade instável”, atesta Marco Antônio Brasil, professor adjunto da Faculdade de Medicina da UFRJ, “Tristeza ou Depressão”, 19ª Jornada de Psiquiatria da Associação Psiquiátrica do Estado do Rio de Janeiro (Aperj).

Temos ainda que entender que sentimentos flutuam e que eventos dolorosos da vida causam emoções desagradáveis e comportamentos alterados. E isto pode ser algo passageiro sem necessitar medicar. Pessoas sofrendo de tristeza e angústia normal não precisam ser medicadas.

“A tristeza geralmente não é tão duradoura quanto a depressão. Costuma ter uma duração inferior a seis meses, e os sintomas de culpa e autoacusação e ideação suicida não estão presentes. O paciente com apenas tristeza é geralmente reativo ao ambiente, podendo responder de modo favorável aos estímulos externos. Na depressão, costuma haver sentimentos de culpa e autoacusação, indiferença generalizada pelo ambiente e, nos casos mais graves, ideação suicida. É difícil definir exatamente a fronteira entre depressão clínica, subclínica e não patológica”. (M.A.Brasil).

“A psiquiatria contemporânea confunde a tristeza normal com o transtorno mental depressivo, pois ignora a relação dos sintomas com o contexto em que eles emergem” (Horwitz e Wakefield, citado por M. A. Brasil).

Precisamos ajudar as crianças a serem o que elas podem ser. Como? Pai e mãe devem escutá-las, ampará-las em momentos de tristeza e angústia, não agredi-las por perda do autocontrole do pai ou mãe, dar disciplina não dura demais, expressar afeto por elas por palavras e toque, colocar limites razoáveis e explicando-as sobre o motivo deles quando elas já podem compreender.

As crianças não se tornam mais felizes quando damos tudo o que elas querem. Pai e mãe, antes de disciplinar ou falar com seus filhos, lembrem-se de que sua criança não tem culpa do que vocês sofreram na suas infâncias. Evite repetir com seus filhos os mesmos erros que seus pais cometeram com vocês. 

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César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

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