Semana Botafogo: as pessoas e a instituição

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Um dos clubes mais tradicionais do planeta terra completou 112 anos no último dia 12. A história do futebol jamais teria sido escrita sem o brilho do preto e branco. As duas cores que, desde 1904, jamais precisaram da mistura de qualquer outro colorido. A trajetória de uma instituição é construída por pessoas, obviamente. Mas elas passam. E nada e nem ninguém foi, é ou será mais importante que o clube. O Botafogo de Futebol e Regatas é a sua torcida, a sua gente, a sua história. Ninguém mais.

Ricardo Gomes foi ingrato. Ao mesmo tempo não foi. Depende do ponto de vista. Não é todo clube da grandeza do Botafogo que abre as portas para um treinador na situação em que se encontrava: limitado pelas consequências do grave problema de saúde e desatualizado, sem a prática do dia a dia de trabalho, tampouco dos vestiários e beira do campo. Foram muitas as escalações e opções questionáveis, além de jogos ruins. Mas os resultados, relativamente, aconteceram.

Os objetivos em 2015 foram atingidos. Tanto que Gomes teve respaldo para permanecer mesmo depois da perda do título estadual deste ano. E, principalmente, mesmo insistindo com Gegê, Octávio, Emerson Silva, Ribamar e outros. O trabalho, como um todo, não foi ruim. O time jogava um futebol aceitável pelo material humano disponível. Mas parecia ter atingido um limite, que dificilmente seria ultrapassado. E o Botafogo precisava de mais, pois dentro desse cenário o Z-4 era uma realidade.

De acordo com as informações que circulam por toda a imprensa, o Botafogo não teria efetivado o contrato de renovação depois da recente proposta do Cruzeiro. Embora o reajuste salarial estivesse em vigor. A falta da assinatura deixou o treinador em situação instável. Pelo menos assim ele pensou. E tinha certa dose de razão. Esse que vos escreve possui duas teorias com relação ao assunto. A primeira é a mais óbvia de todas: a do amadorismo sem tamanho da direção do clube no caso. A segunda é mais complexa, improvável, mas não é descartável: como os resultados não vieram e o time não respondeu como o esperado em campo, sem uma sequência para sair do sufoco, o Botafogo postergou a renovação no papel. “Sem jeito” para demiti-lo, praticamente o deixou à vontade. E assim também ficou. Parece que o Botafogo nunca esteve totalmente seguro sobre o treinador. E vice-versa. Não era o momento de assumir uma multa de R$ 1 milhão. A proposta chegou e ele se foi. Bom pra ele? Talvez. Financeiramente com certeza. Bom para o Botafogo? Apesar deste colunista aprovar o trabalho de Gomes no geral, talvez sim.

O fato é que o Botafogo viveu uma semana de Botafogo. Torcida insatisfeita por conta de uma apresentação abaixo da crítica contra a Ponte, e ao mesmo tempo, ansiosa para ver o time novamente em campo. O botafoguense é assim: ama e odeia na velocidade do pulsar de seu coração. Mas a paixão incondicional sempre fala mais alto. A raiva só reafirma o quanto o Botafogo é importante na vida de cada um que é escolhido pela Estrela Solitária.

Mas voltando à “semana Botafogo”, surgem as especulações sobre o interesse do São Paulo em Ricardo Gomes. Silêncio até a sexta-feira, 12, dia em que o Botafogo fez aniversário. O presente? A confirmação da saída do treinador, levando a já desconfiada torcida a navegar por um mar de incertezas. Pouco tempo depois, o anúncio da efetivação de Jair Ventura. Nem deu tempo para os colegas de imprensa confirmarem se era real o interesse em Milton Mendes, por exemplo. Em meio a todo esse turbilhão, um jogo contra o São Paulo no Morumbi. Sim, o São Paulo! Futuro time do ex-treinador. O responsável por agitar ainda mais um ambiente que já não era dos mais tranquilos. Não se mexe assim com o Botafogo.

Sempre que a situação parece irreversível e as dificuldades parecem insuperáveis, o Botafogo renasce. O clube que não é favorito nem quando tem o favoritismo também não está morto, mesmo quando tentam assinar a certidão de óbito. A transmissão do jogo por um canal de televisão fechado mais parecia um evento do São Paulo, exaltando as conquistas da equipe, os ídolos... Que pena! Mantiveram o foco em um clube que passou a ser alguma coisa da década de 90 pra cá. Desde quando organização, estrutura e dinheiro passaram a fazer brutal diferença dentro das quatro linhas. O São Paulo é grande há uns 40 anos. Só que do outro lado havia um clube que é gigante desde 1904.

O Botafogo jamais precisou de títulos ou mídia para reafirmar a sua grandeza (lamentável não ter uma estrutura condizente). É gigante simplesmente por ser o Botafogo de Futebol e Regatas. E não por conta de A, B, C ou Ricardo Gomes. Mesmo com os erros individuais, que insistem em comprometer a trajetória no Campeonato Brasileiro, a equipe mostrou organização. Mesmo com a falta de profundidade no ataque, principalmente pela total falta de ritmo de Canales, uma ou outra chance surgiu. Mesmo sem o ídolo Jéfferson e com algumas rebatidas para o meio da área, Sidão foi fundamental. Mesmo com a displicência de Bruno Silva e a falta de inspiração do ótimo Camilo no meio-campo, houve uma ou outra triangulação, consciência tática e tranquilidade pra jogar. O que não teve a mais foi por falta de qualidade. Não por ausência de alma, como contra a Ponte.

Pode parecer clichê, mas a vitória teve sim, o dedo de Jair Ventura. Mostrou um pouco mais de ousadia ao tirar Bruno Silva e colocar Rodrigo Pimpão. O Botafogo terminou o jogo dentro do Morumbi com três atacantes. E isso é saber reconhecer o tamanho do clube, apesar das limitações. Filho de quem é, parece entender que o Botafogo nunca pode entrar em campo apenas para não perder. Mesmo mais ofensivo, na teoria, o time não deixou de lado a organização e a marcação. Mas criou em dois contra ataques. Um com Pimpão, e outro em grande jogada de Diogo Barbosa. Exatamente aos 48 minutos do segundo tempo, no lance em que Sassá, opção do técnico, fez o gol da vitória.

Uma vitória Botafogo em uma semana Botafogo. O alvinegro, que tão bem tem representado o clube nos Jogos Olímpicos e em cada canto do Brasil, pode sorrir durante essa semana. Nem que seja tímido, com “o canto da boca”. Orgulho sempre teremos. Azar dos ingratos e dos que pensam que o Botafogo está morto. Para cada grau de desconfiança, uma dose de surpresa. O Botafogo é assim. O botafoguense é assim. A consciência ainda diz – com toda a razão – que o caminho para se manter na elite é longo e duro. Mas cá pra nós, alvinegro: duvido que você não olhou a diferença de pontos em relação ao G-4, lembrou que o time tem um jogo a menos, que ainda estamos vivos na Copa do Brasil...

Isso é Botafogo! Mais uma semana Botafogo pela frente! O que ela nos reserva? Qualquer coisa. Muita coisa. Ou simplesmente nada. Vivamos essa paixão. Saudações alvinegras!

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