Se permitir

sábado, 25 de junho de 2016

O olho do furacão não é uma ilusão ou metáfora. Não está distante, nem perto. Estamos dentre dele sempre e ele está dentro da gente provocando um turbilhão de coisas boas e ruins que nos fazem mal e também bem. A vida se faz no olho do furacão que se move no seu tempo, respeita o tempo, se alimenta do tempo para por fim no vomitar no tempo. O que se fez e o que não se fez... O que se permitiu e o que não se permitiu.

Se permitir. Desatentos, nos esquecemos de se permitir. A felicidade e a tristeza existem. A paz e a dor existem. É preciso admitir as suas existências. E a vida é essa experiência sempre inacabada em sentir e o que sentimos, ainda que desapercebidamente seja o que nos transforma. Somos seres em eterna transformação, em evolução, em ebulição constante - sem evaporar. Não precisamos evaporar, só precisamos nos permitir.

Se permitir sentir a dor e a paz, porque só chega à paz quem um dia soube o que é a dor. Se permitir a sentir a felicidade explodir no peito, porque só é feliz quem um dia teve o conhecimento do que é tristeza. A vida não é uma linha reta constante. A vida se faz de muitas variáveis, repletas de oportunidades, mas sempre resultado de nossas escolhas. A vida se faz em curvas tranqüilas, outras mais perigosas.

Não dá para seguir sempre em velocidade máxima, nem dá para sempre seguir em marcha lenta e é necessário muito cuidado ao frear. Freadas bruscas machucam. É preciso dosar os passos, como é necessário correr riscos. Se ganha, se perde, se decepciona e se surpreende.        É assim para todo mundo! Mas é preciso se permitir. Se permitir falar sem medo de dizer. Se permitir silenciar, sem receio de falar tudo o que sempre quis. Se permitir ser si mesmo... Se permitir ser abraçado e abraçar, ser amado e amar, ser feliz e fazer alguém feliz.

Não há outra finalidade que não a de ser feliz. Ser feliz, sabendo que nem sempre se poderá ser feliz, mas se permitir o caminho já é ser feliz. É preciso caminhar, esperar, respirar para saber pela felicidade ser abençoado.

É como a saudade. Só pode sentir saudade quem um dia soube o que é ter algo ou alguém. Esses intervalos de ausência de alguém ou de um momento nos dão a certeza de que estamos vivos e daquilo que queremos exatamente. A saudade nos concede o privilégio do discernimento. É preciso se permitir sentir saudade...

Se permitir, nos permitir ser arrebatado pelo tempo e pelas pessoas. É preciso se permitir confiar. Nos outros e crer que pode dar certo, ainda que de um jeito imperfeito, mas que seja perfeito enquanto há o respeito, o valor dado e recebido. Se permitir a ingenuidade de confiar antes mesmo de ter a confiança conquistada. Por que a confiança não anteceder tudo?

Se permitir tentar ainda que tudo e todos digam que não dá! Se permitir o atrevimento e também o recolhimento. Se permitir ter fé nas tempestades e na bonança. Se permitir ficar sozinho e também no meio da multidão desconhecida. Se permitir o cansaço e o esgotamento de energia. Se permitir conversas de ventilador e também palavras que não se esquecerá. Se permitir promessas de amor.

Ninguém nos deve o consentimento da permissão a não ser nós mesmos. Ninguém pode nos proibir de nada, a não ser que se tenha escolhido dar esse direito a outro alguém. Mas o dom de julgar não é uma tarefa fácil e por isso mesmo é que se pode se permitir à liberdade de observar, evitando a interferência naquilo que achamos conhecer, mas que de fato não sabemos.

A natureza, a vida de cada um segue um fluxo de acordo com suas permissões. Cada um sente de um jeito e coloca isso para fora de uma maneira própria. É preciso se permitir o respeito à própria permissão, o que não quer dizer que se permita amar sem lealdade, amar sem confiança, amar sem receber, amar sem ser mútuo o amor.     

Se permitir. Se permitir se ter, ainda que por poucos instantes. Se permitir se doar ainda que isso não seja constante. Estamos no olho do furacão e não dá para escapar dele fugindo. É preciso admitir que nada é fácil e nem tão difícil assim, a não ser o poder de decidir o que se permite e o que quer se permitir...

 

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Wanderson Nogueira

Wanderson Nogueira

Observatório

Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e agora é deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna diária.

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