Casamento: Um Desafio?

quinta-feira, 12 de maio de 2016

A vida adois é um desafio. Em meu primeiro livro, "Casamento: O que é isso?" (2000), apresento o matrimônio como algo incompatível por ser uma união de duas pessoas diferentes. Gênero diferente; desejos diferentes; forma de pensar diferente; visão da vida talvez diferente; às vezes religião diferente, ou maneiras diferentes de viver a mesma religião.

Um funciona com lógica matemática e outro com ilógica (não é falta de inteligência). Um enxerga o detalhe e outro vê o global, um adora romance e o outro se sente incomodado com muito romance. Um é muito sentimental e o outro muito racional, um veio de uma família em que todos se comunicam com frequência e o outro veio de uma família em que a comunicação é escassa. Um quer parentes em casa com frequência e o outro detesta isso. Um é impulsivo e o outro pensativo, um é arrumado e o outro é bagunçado. Um é acelerado e o outro é lento, um gosta de praia e ou outro de montanha, um fala demais e o outro é calado demais. Um quer fazer as coisas sempre junto com o cônjuge e o outro não. Um quer sexo todos os dias e ou outro uma vez ao mês. Um tem orgasmo rápido e o outro demora muito.

Adicione-se as diferenças de gostos que podem ser opostas, como filmes, música, comida, local onde passar férias, etc., e a conclusão será: como é que isso pode dar certo? Além de tudo, cada um leva para dentro do casamento problemas emocionais vividos durante a infância, que podem ser complicados ou não, mas que influenciam a vida de forma inevitável.

Uma jovem que teve um pai autoritário e mandão, casa com um homem também autoritário. Esse marido, por sua vez, pode ter vindo de uma infância em que seu pai (ou mãe) pode ter sido dominador (a), daí o fato dele casar-se com uma mulher passiva a quem quer dominar.

Na verdade, ele quer uma mulher "forte" que cuide dele (que pode ser mesmo mais forte que ele no auto controle emocional), mas geralmente não deixa isto ocorrer porque parece que há uma necessidade inconsciente de repetir a história passada, ou seja, repetir o papel autoritário do pai (ou da mãe). A esposa dele também pode ter necessidade de continuar num papel passivo aprendido com sua família de origem, quando, na verdade, quer independência.

Outro exemplo pode ser o de um indivíduo que viveu com pais super protetores e entra no casamento com a tendência de super proteger, o que pode esconder (muito ou pouco, de maneira disfarçada ou explicitamente) seu próprio desejo de ser super protegido. Se essa pessoa obsessiva com proteção não receber a mesma carga de atenção para ela ou para os filhos, possivelmente criticará o cônjuge. Pode também negar dizendo que não precisa de superproteção, mas de cuidado normal.

Super proteção não é amor, nem o mesmo que cuidar bem de alguém. Super proteção pode ser manifestação de ansiedade. Significa que a pessoa que super protege não acredita que as pessoas alvos de sua proteção exagerada tenham condições de lidar com seu problema atual. Não acredita nas capacidades da outra pessoa. Imagine uma esposa super protetora tendo um marido não super protetor. Ela talvez o terá como indiferente, enquanto que o problema pode ser mais dela do que dele. Se ela não enxergar isto, tensões podem surgir.

No casamento lida-se o tempo todo com fatores inconscientes. Os impulsos inconscientes fluem e interferem na vida a dois. Se cada um não melhorar a consciência de si mesmo, e não procurar entender como as dificuldades emocionais vividas na família de origem durante a infância afetam o relacionamento atual, é muito difícil o casamento ser uma experiência agradável e harmoniosa. Na melhor das hipóteses se tornará superficial. Um irá tolerar o outro, o que é diferente de harmonia agradável.

É difícil separar onde termina o problema emocional ou psicológico pessoal que cada um levou para o casamento, e onde começa o problema emocional do casal.

Gosto do pensamento: "Primeiro de tudo … olhe-se a si mesmo. Depois …olhe-se de novo." É difícil isso. Mas na vida conjugal (e em outros relacionamentos) é importante parar de ficar culpando o outro por sua infelicidade, e fazer algo para melhorar os problemas emocionais trazidos para o casamento. Paz interior e serenidade são muito pessoais. E, na verdade, nossa maior luta é com nós mesmos. Mas se cada cônjuge não perceber isso, ficará perturbando o outro o tempo todo. Então, o relacionamento fica mesmo incompatível.

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César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

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