Conversa de casal

quarta-feira, 16 de março de 2016

Eu quero saber é se o presídio daqui admite visita íntima

- Quanto custou isso?

- Acho que você ficará mais feliz se não souber.

- Vai ver custou uns oitocentos reais! Oitocentinhas! Você não tem pena de mim, essa é que é a verdade! Pode falar: eu já tomei um Rivotril hoje de manhã.

- Foi um pouco mais de mil.

- Minha Nossa Senhora Protetora dos Maridos Falidos! Mais de mil quanto?

- Um pouquinho só, não se preocupe.

- Fala logo: quanto mais?

- Três mil e quinhentos.

- Esse troço custou três mil e quinhentos? Estou arruinado.

- Não! Custou três mil e quinhentos a mais que mil.

- Não acredito! Me empresta a calculadora.

- Não precisa: dá quatro mil e quinhentos.

- Caramba! Acho que você pensa que eu sou daquela turma da Petrobras. Pois fique sabendo: ninguém põe dinheiro na minha conta sem eu saber quem nem por quê. Aliás, só tiram. Principalmente você.

- Se acalma, homem! Há mais de 40 anos que você reclama e até hoje não foi preso, como vive dizendo que vai ser.

- Que eu vou ser preso por dívidas, não tenho dúvida. Eu quero saber é se o presídio daqui admite visita íntima.

- Visita íntima, o que é isso?

- Invenção brasileira. Preso também precisa se distrair, é ou não é?

- Eu é que não vou lá.

- Pra falar a verdade, eu não estava pensando em você.

- Rá-rá-ra! Nem solto você consegue outra...

- Desde que te conheci não sei o que é viver solto, isso sim.

- Bom, posso levar uns livros para você ficar lendo.

- Leva os livros. Cigarros também.

- Ué, você vai começar a fumar?

- Não. É para fazer política de boa-vizinhança com os colegas de cela.

- Não sei por que esse escândalo todo. Outro dia acessei sua conta e tinha mais de cinco mil. Sem falar naqueles cinquenta da poupança.

- É isso que dá confiar nas mulheres. Nunca mais te falo minha senha. Onde você vai botar isso aí?

- No quarto. Vou trocar todas as coisas velhas do quarto.

- Com certeza eu também estou nesse embrulho...

- Você fica. Por enquanto.

- Tô morto. Mortinho da silva.

- Deita aí que num instante eu te faço reviver...

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Robério Canto

Escrevivendo

No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

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