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Ecos da bibliodiversidade ou pastéis de vento
Vocês, por acaso, sabem o que é bibliodiversidade? Um conceito novo, criado há alguns anos apenas, provavelmente na América Latina.
Vou começar a explicá-la a partir desta imagem que mostra um menino sentado sobre uma pilha de livros. Alguns são grossos, outros largos, muitos de capa envelhecida. Os novos estão entremeados entre todos. A pilha é tão comprida que o menino coloca os braços sobre um muro alto e admira a paisagem. A paisagem é o mundo.
Ao percorrer os estandes da Primavera do Livro me reportei à imagem; estava diante da multiplicidade de obras. Tive, então, vontade de abrir todos, sentar-me ao pé de uma palmeira, ler um a um e levar para casa os que mais me interessavam. Na verdade, a minha intenção era ampliar meu olhar para as coisas da vida para entendê-la melhor.
A bibliodiversidade se refere à diversidade das publicações disponibilizadas aos leitores e abraça os livros recentemente lançados, os antigos, até as obras mais raras.
Da mesma forma que o mundo natural caracteriza-se pela biodiversidade, isto é, a variedade de vida existente no planeta, em todos os seus ecossistemas formados pelos organismos, o mundo literário também pode ser definido pela bibliodiversidade. As obras literárias formam ecossistemas, uma vez que são criadas por seus autores a partir de leituras diversificadas de outras obras e pesquisas extensas em diferentes gêneros literários: romances, poesias, contos, crônicas, pesquisas, biografias e ensaios.
Da mesma forma que a biodiversidade está ameaçada pela ocupação desordenada do espaço e pelas relações de desrespeito do homem para com a natureza, a biliodiversidade é prejudicada pelo mercado de consumo, quando a valorização do lucro se sobrepõe à qualidade literária.
Mas por que estou escrevendo isso, se a minha coluna é sobre a literatura infantojuvenil?
Só porque estou muito preocupada com o nosso Brasil! E nós, o povo, precisamos ampliar nossas capacidades de pensar: observar, deduzir, concluir, criticar e decidir. Um pensamento empobrecido desencadeia palavras frágeis que, por sua vez, causam ações equivocadas. A leitura é um dos principais meios que temos para desenvolvê-las.
Vivemos em um país de dimensões continentais, com uma população de aproximadamente duzentos milhões de habitantes, com pelo menos sessenta milhões de crianças e jovens. E o Brasil não é um país de leitores! Inclusive, os brasileiros estão cada vez lendo menos; estão substituindo o hábito de ler livros, jornais e revistas pela televisão, DVDs e pelas redes sociais na internet.
Como a bibliodiversidade encontrará ecos em um país onde a leitura não é um hábito disseminado?
A leitura transforma; não é apenas um passatempo. Tem função social. É direito de todo o cidadão. É dever do estado oferecê-la e incentivá-la. É cultura. É vida.
A bibliodiversidade quando encontra ecos nos leitores, dissemina ideias, fazendo-as influenciar ambientes; soam pelas esquinas, praças e salas de jantar. Mas se esquecidas nas estantes das bibliotecas ficam caladas nas páginas dos livros; tornam-se ocas como pastéis de vento.
Os livros são como os antigos mascates que distribuíam mundo afora bens e serviços, oferecendo a oportunidade aos consumidores opções de mercadorias. Os livros carregam ideias, informações e conhecimentos. Mas se fechados não cumprem sua função.
O desenvolvimento do hábito de ler é longo; é preciso ler desde cedo. Aí, o livro de literatura infantil além de ser prazeroso e preencher as horas de lazer, é ilustrado, o que encanta e motiva. A alma da criança é inquieta e curiosa. Qual o leitor que não quer saber aonde estava indo aquele coelho que corria, sem parar de tirar o relógio do bolso para ver as horas? E quando acaba de ler a história de Lewis Carol, será que não vai querer saber do Gato de Botas?
E, assim, o gosto pela leitura vai sendo construído.
Enfim, gostaria de iluminar nossa conversa com Muriel Barbery, autora de Elegância do Ouriço (Companhia das Letras): “Para papai, o jornal e o café são as varinhas de condão que o transformam em homem importante. Como uma abóbora se transforma em carruagem.”
A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.
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