Colunas
A evasão no ensino médio
Quando alardeamos nossos percentuais acima de 90% de presença das crianças na escola, referimo-nos ao ensino básico. Mesmo assim há mais de três milhões fora da escola estando em idade escolar. Perdemos de longe para o Japão, a Holanda e para os países do cone sul, nossos vizinhos.
Quando adentramos ao ensino médio a realidade é mais séria. Enquanto a média brasileira relativa à frequência à escola não atinge o percentual de 83%, no Nordeste este índice está em 48%. Há, portanto, uma grande massa de jovens que não está se preparando para o Brasil de hoje e de amanhã.
As causas da evasão são claras para quem estuda estes assuntos, senão vejamos: os currículos e programas de nosso ensino médio não despertam o interesse dos nossos alunos. Estão focados para que uma pessoa possa chegar à universidade. O ensino médio não consegue apresentar uma conclusão de curso, somente continuidade para a universidade. Só uma classe social mais abastada pode pensar desse modo. Muitos jovens necessitando ajudar às suas famílias deixam a escola e dirigem-se para o mundo do trabalho, aprendendo no próprio trabalho o desempenho de sua função. A perspectiva será de salários muito baixos por causa do nível de escolaridade; os professores deste segmento são, a cada dia, mais improvisados. Há muitos engenheiros ministrando aulas de matemática e física, biólogos e dentistas lecionando biologia e advogados lecionando história e língua portuguesa. Para cada dez professores de física no Brasil, apenas três possuem licenciatura. Faltam 60.000 professores de matemática e, no conjunto, o Brasil tem uma carência de 300.000 professores nos níveis básico e médio. Ora, sem professores formados e não sabendo ministrar aulas, agrava-se a situação já apresentada pela ineficiência da linguagem ao ensinar e pelos equívocos da didática usada. Peca, a escola brasileira, por ser ineficiente e ineficaz. Ineficiente enquanto ensina sem envolver a aula com o entusiasmo e beleza que ela requer e ineficaz porque o que é lecionado não interessa ao alunado pela falta de adequação; o tempo dos alunos na escola é insuficiente. Se pensarmos que um aluno, ao assistir aulas, apenas entende, para que ele aprenda há necessidade da realização de exercícios e de problemas. Muitos só conseguem fazer tal coisa com o auxílio de um professor, o que não é encontrado fora da escola. O tempo para uma recuperação paralela e para a fixação da aprendizagem é exíguo. Diante de tantas derrotas ao longo do curso, poucos têm resistência para continuar a caminhada, preferindo sair para não passar vergonha diante de uma reprovação; os salários dos professores não são estimulantes e muitos devem, ao trabalhar em mais de um estabelecimento de ensino, incluir no seu dia letivo longas viagens entre um bairro e outro, quando não, entre uma cidade e outra. Com essa perspectiva não são atraídos bons profissionais que poderiam reverter o baixo nível de aprendizado dos alunos. Apenas 2% de nossos alunos do ensino médio desejam procurar o magistério como profissão. A situação mais grave é a observação de que os que procuram os cursos de pedagogia representam as notas mais baixas no Enem.
Pelo exposto fica claro por que temos evasão. Só aumentaremos os índices de permanência com a mudança dos quatro tópicos abordados acrescentando mais um: as condições de trabalho e de oferta de laboratórios e bibliotecas para as escolas. Sobretudo no ensino médio o aluno precisa saber fazer, precisa ter uma biblioteca onde possa ler porque o livro é caro e o Brasil tem, hoje, o preço médio dos livros em torno de R$40,00, contra R$25,00 no Chile e Uruguai.
Há um erro histórico no Brasil devido à estrutura de nossa colônia de exploração. As colônias de povoamento aprimoraram muito mais o ensino intermediário entre o básico e o superior, equilibrando a distribuição da população entre estes três setores. O ensino básico nesses países, após as independências, sempre foi básico e com o objetivo da criança permanecer na escola. Nos Estados Unidos há uma lei federal que impede há muitos anos a dispensa da escola para crianças portadoras de necessidades especiais. No Brasil sempre foi diferente e está difícil, ainda hoje, de haver uma mudança significativa. O ensino básico sempre foi promotor de grandes reprovações, até porque os conteúdos estão acima da capacidade psicológica da criança. Ensinamos no ensino básico o que outros países ensinam no ensino médio. As nossas escolas oferecem poucas oportunidades de tempo integral. As nossas salas de aula estão com uma quantidade de alunos muito acima da capacidade de absorção por parte de um professor. Li, há semanas, um artigo que afirmava que esta questão de quantidade de alunos em sala era irrelevante, citando a Universidade de Harvard, como padrão de medida, onde há salas com mais de 1.000 alunos. Realmente não compreendo como pessoas tão bem qualificadas afirmam tal coisa. Para uma universidade, para uma conferência, onde os alunos são adultos, concordo; no entanto, sendo crianças e adolescentes, uma sala de aula com mais de trinta alunos torna-se improdutiva, sobretudo por causa do tempo de concentração de um adolescente que, hoje, mal ultrapassa os dez minutos.
Nós temos dois caminhos: ou investimos em educação com uma visão abrangente dos problemas que acabam de ser apresentados e nos preparamos para outro salto de desenvolvimento ou continuamos como estamos, preparando desempregados!
Hamilton Werneck
Hamilton Werneck
Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.
A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.
Deixe o seu comentário