Sapo cansado

quarta-feira, 20 de maio de 2015

O que faz o sapo pular, diz a lenda, é a necessidade. Cara gordinha, jeito folgado, perna cumprida, fica ali sentadão, por horas, em torno da luz, esperando um inseto dar mole...

Personagem comum aos contos de fada, sapos viram príncipes e alucinam princesas, os sapos estão por aí, cansados de serem negligenciados; pior, cansados de serem tratados como sapos.

Cada vez que uma crise se anuncia, renovam-se as esperanças, dentro de mim, de que esse monte de sapo espalhado por nossas lojas, empresas e repartições públicas pulem. Pulem pra fora na direção exata de empresas que consigam vê-los como príncipes.

A crise tem o poder de transformar sapos em príncipes e príncipes em sapos, ou seja, a crise inverte valores que jamais deveriam ter sido invertidos, vendedores voltam a ser vendedores, e consumidores, voltam a ser príncipes.

É claro e evidente que não são todas as lojas, vendedores e marcas que olham e creem que consumidores são como sapos cansados, mas vamos combinar, estes estão por toda parte.

Vendedores, processos, sites, procedimentos, pessoas, ainda tem muita coisa o que melhorar e se vivermos em estado de desenvolvimento, seremos sempre vítimas de nossa própria arrogância, achando que prosperamos por mérito e não por inércia do mercado. 

É indiscutível que muitos negócios, pessoas, sites e ven-de-do-res obtêm crescimento por pura inércia mercadológica ou ausência de concorrência, ou ainda por pertencerem a uma marca nacional mais forte que a gestão local ou a um domínio mais inteligente que a ergonomia do site, e é claro, um produto melhor que o intermediário de venda. 

Tudo isso ainda termina em bons resultados, quando o universo sopra a favor, mas quando o universo conspira negativamente ou vento sopra contra, aí, tudo muda...

A crise tem o poder de higienizar o mercado, a crise vai afetar mais fortemente todos os despreparados, os que não gostam do que fazem, os que se veem acima de quem é atendido, os que têm arrogância acima do cérebro, coração ou atitude, e a processos que tratem consumidores como mais um.

A crise apaga luzes e empurra naturalmente mais sapos para menos postes.

Na crise o dinheiro ganha valor, o que faz com que consumidores se sintam com mais valor e consequentemente exijam ser mais valorizados. Processos, pessoas e marcas precisam olhar para dentro e buscar respostas sobre o que elas estão fazendo no caminho de perpetuar um conceito onde o consumidor ganhe destaque e posicione-se acima de qualquer outro valor, inclusive, lucro de curto prazo.

Lojas ainda insistem em olhar para consumidores como mais um. Mesmo diante da milésima venda da empresa, a centésima venda do vendedor, é preciso atentar que esta pode ser a primeira compra do cliente, ou ainda pior, a terceira ou quarta do cliente, momento em que o cliente já tem maior segurança e parâmetros para lidar e, principalmente, reagir à má venda.

Vendedores, processos e marcas precisam cuidar do acolhimento do comprador e parar de acreditar que o consumidor pertence a eles. Consumidores são entidades livres, etéreas, que não podem ser presos, confinados, apenas atraídos. Eles sobrevoam e jamais pousam, assim cabe a nós agradá-los, jamais agarrá-los. 

Cadastros insuportáveis em lojas e sites, em vez de conversas de sondagem, ainda marcam o que deveria ser um “seja bem-vindo”, e assim consumidores são tratados como sapos em vez de príncipes. 

Quem ainda acredita que no conto de fadas o sapo que recebe o beijo é o vendedor ou a empresa, ainda não entendeu nada. Nós, que vendemos, temos por princípio fé e prazer em beijar sapos e transformá-los em príncipes, reis... Vossa alteza é, e sempre será, o consumidor e nada como uma crise para fazer o sapo pular, de loja em loja, de marca em marca, de vendedor em vendedor, em busca de beijos... Prepare seu batom, o sapo está pulando e cada vez mais.

“Roberto Mendes é publicitário, especialista em marketing pelo Instituto de Administração e Gerência da PUC/RJ, professor titular da Universidade Candido Mendes e sócio da Target Comunicação.”

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