Avaliar ou examinar? (Parte Final)

terça-feira, 09 de setembro de 2014
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O blog do Troll nos oferece uma excelente imagem para debate, permitindo distinções que recriam as várias posturas de educadores, alguns a favor da pergunta-crítica à nossa avaliação e, outros, desconstruindo-a para preservar o que se faz em muitos casos de aferição do rendimento escolar.

Se pensarmos em Cipriano Luchesi, por exemplo, ele nos diria que não se trata de uma pergunta de avaliação, mas como está expresso na fala do professor, de um exame e, portanto, reporta aos arcaísmos das medições que nos lembram da antiga China, onde os exames começaram. Luchesi reafirmaria tratar-se de uma "examinação”.

Os conservadores que negam esta apresentação como uma crítica ao nosso sistema educacional padronizador e nivelador que, na verdade, pré-define os resultados, usam uma velha estratégia da escolástica negando a paridade entre bichos e pessoas. Diria, então, que se fossem pessoas, haveria uma inteligência que os animais não têm, permitindo uma série de estratagemas para escalar a árvore. Assim, negam a possibilidade da figura desenhada retratar a nossa realidade. Negando-a liminarmente, nada mais haveria para ser discutido. Infelizmente, estas táticas que habitam o modo mecânico de pensar ou modo estereotipado de refletir ainda perduram e a prova disso é que se uma pessoa que esteja lendo este artigo fizer parte deste grupo conservador, começará a nutrir uma raiva, quase incontida, em relação a quem escreve e terá vontade de enviar-lhe um e-mail contestando a crítica que está sendo feita.

Estou do lado do blog do Troll quando apresenta esta imagem que me parece excelente para discutir questões de avaliação. Primeiro penso como Luchesi que se trata de um exame e, portanto, não considerará o planejamento, os critérios de avaliação, os diagnósticos e a inclusão. É algo que critica a ação excludente da escola por causa da interpretação linear de que todos devem ter as mesmas habilidades, as mesmas linguagens e dominar os mesmos conteúdos.

Pergunto, então, como estes bichos chegaram até este teste final? Muito simples e claro, em se tratando de um exame e, certamente, final, eles não tiveram conhecimento sobre os processos de avaliação. O professor, com aquele ar bem desenhado de neutralidade, não praticou avaliação diagnóstica, nem continuada. Deixou tudo para o final e para este momento fatal. Quando a distância no tempo entre o momento do ensino e da avaliação são muito grandes, o processo usado não oferece informações seguras e os alunos podem obter resultados muito aquém do desejado porque o professor não conseguiu repor o conhecimento. Se houvesse alguma orientação sobre uma real avaliação, teríamos alunos que não precisariam do curso porque sabiam mais que o professor já na primeira aula. Considero, neste caso, o "macaco” pós-doutor em escalada de árvores. Coitado do macaco, ouviu explanações sobre o que a sua natureza lhe fornecera previamente e de modo gratuito e, agora, no momento do exame, percebeu quanto tempo de sua vida perdeu. Poderia, perfeitamente, ter desenvolvido outras habilidades.

Temos de confessar que o elefante, se soubesse dos processos avaliativos, não completaria o primeiro dia de aula nesta escola, o mesmo acontecendo com a foca, o peixe e o pinguim. O "cachorro” ainda nutre algumas esperanças e, durante o exame, conseguindo superar a primeira parte com um ágil salto, iria estudando a passagem entre um galho e outro, podendo chegar ao topo. Como se trata de um exame para escalar, nada é dito sobre a descida do animal e como o cachorro conseguiu, com muita dificuldade, lograr êxito em sua façanha, recebeu uma nota seis e foi aprovado sem estudos adicionais de avaliação.

O caso do "passarinho” é mais próprio de um conselho de classe. Ele foi reprovado porque não escalou a árvore. Havia na pergunta o verbo escalar, como gostaria Benjamin Bloom que fosse escrito em seus objetivos cognitivos. Ali estava embutido o critério a ser usado para medir a habilidade do pássaro que, conforme sua natureza, ouvindo a pergunta, alçou voo e chegando ao topo cantou uma linda canção comemorativa da vitória. Foi reprovado porque não seguiu as exigências do critério e condição do objetivo do programa. Por duas horas o conselho de classe discutiu a questão, tendo o pássaro, por milagre, sido aprovado, quando um professor lembrou-se de que Einstein foi reprovado no quinto ano da escola exatamente porque não seguia o mesmo caminho traçado pelo professor. 

Mas ainda restam esperanças para a foca, o peixe e o pinguim. Eles torciam para que naquele momento desabasse um grande temporal, fazendo surgir uma enchente que cobrisse a árvore. Se tal fenômeno ocorresse naquelas horas de exame, mesmo que outros colegas morressem afogados — e não sei se o professor escaparia — eles teriam todas as chances de serem aprovados, mesmo que o dilúvio cobrisse por completo a árvore. Mas, preocupados com a solidariedade, os nossos "alunos – bichos” estavam torcendo para que as perdas fossem mínimas. Se uma pequena parte da árvore ficasse livre da cheia para abrigar o cachorro e o pássaro, só o elefante seria reprovado, apesar de o nado ser melhor que a escalada.

Todos esses pensamentos do peixe, foca e pinguim não foram longe porque em caso de catástrofe dessa natureza as aulas seriam suspensas e o exame marcado para outra data.

Bela crítica, porque depois de tantas distinções e arrazoados, concluímos que somente seria aprovado o que já era esperado, o macaco, exatamente o que não precisaria de aulas para esse fim.

Aí está uma excelente crítica que atinge algumas escolas: ensina-se o que não atende aos alunos, os que já sabem são obrigados a perder tempo e as diferenças individuais não são consideradas porque, mesmo em se tratando de seres humanos, as inteligências manifestam-se de modo diferente e precisariam ser consideradas enquanto se desenvolve o processo de aprender, criar e inovar.

Uma boa avaliação deve partir do princípio de que a preparação torna-se parte essencial deste processo, definindo qual a finalidade, o que será avaliado e o que será perguntado conforme uma tabela de especificação, para que não haja concentração em determinadas unidades de ensino em detrimento de outras. É neste primeiro passo da organização de uma avaliação que o tempo de aplicação e os critérios precisam ser definidos, assim como o que será feito com o resultado. Se com o sistema de exames, tudo termina com ele, nas avaliações torna-se mais importante o que faremos com ela.

Aplicada uma avaliação, ela precisa ser corrigida dentro de uma ou duas semanas. A partir deste tempo ela perde completamente o sentido porque o professor não terá como ajustar o que não foi assimilado pelos alunos. O tempo passou, outros conteúdos novos não foram assimilados por falta de conhecimento anterior e o volume de desconhecimento é tal que os alunos que não estavam acompanhando o ritmo ficarão mais perdidos ainda.

Após uma avaliação devemos comunicar os resultados e definir, o mais breve possível, o que faremos com eles.

A exposição feita permite em todas as etapas apresentadas serem acompanhadas por um coordenador pedagógico que, enquanto avalia o instrumento usado pelo professor, poderá verificar o desempenho dos alunos, os encaminhamentos para uma recuperação segura e, ainda, quais mudanças deverão ser seguidas pelo professor para dar mais eficácia ao seu trabalho.

Enfim, se os exames são pontuais, as avaliações permitem flexibilidade no tempo; se os exames apresentam resultados para alguém ser aprovado ou não, sem condições de recuperação, as avaliações têm características diagnósticas que regularão as ações recuperadoras. Se os exames consideram a média entre os resultados que indicavam que o aluno não sabia, com aqueles em que ele manifestou conhecer o assunto, as avaliações observam a desempenho final: aprendeu ou não aprendeu.


Prof. Hamilton Werneck é pedagogo, escritor e palestrante

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Hamilton Werneck

Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.

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