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Simplesmente não se importa
quinta-feira, 29 de maio de 2014
Comprar é uma necessidade. Seja física, orgânica, psicológica, circunstancial, social, etc. Diante desta realidade, parece que ainda há muitos vendedores e pontos de vendas acomodados nesta circunstância.
Entre os muitos estereótipos de vendedores, um me incomoda mais.
Existe um que se limita ao "tem, mas acabou”, que na prática significa que não tem, e ainda mais na prática significa que ele não está interessado em resolver a demanda do cliente, ignora a necessidade e atêm-se ao produto indisponível. Não compreende que possui um portfólio que, diante de algumas perguntas, poderia ter uma solução melhor que a desejada pelo cliente inicialmente. Mais que informação, mais que iniciativa, lhe falta compromisso, instinto, desejo.
Outro típico vendedor ruim é o atochador. Ele vê em cada cliente uma vítima. Enxerga o potencial de uma venda e segue farejando sangue. Tudo que pode, vende. Gaba-se de vender geladeira para esquimó e ignora que há cobertores, luvas, lareiras a serem vendidas. Olha a venda como uma única oportunidade e desconhece que ela é um processo, uma conquista. Pode ter resultado de venda bom, mas afugenta os clientes no médio prazo. É letal para a empresa sob um olhar mais cuidadoso.
Outra figura comum é o guia. Sabe tudo da concorrência. É interessado, possui GPS, bússola e mapinha e toda vez que um cliente chega e pede algo que ele não tem, não investiga, não avisa ao dono, não anota, ele simplesmente te leva até a calçada e te indica como chegar ao concorrente. É rico em detalhes, atencioso, um ótimo guia de compras e um péssimo vendedor.
O tirador de pedido é figura batida. Compramos apesar dele. Cumpre tarefa, é morno, não vivencia o que faz ou o que queremos, apenas cumpre a tabela. É o jogador que fica na barreira, põe as mãos à frente do short e protege-se. Não pula, não avança, não faz gol, não impede gol, só toma bolada. Este, sempre que pode, esconde-se atrás de um balcão. Aliás, ama um balcão. Normalmente, se tentar tirá-lo de seu ambiente, pode gerar desconforto, tremor e até vertigem.
Quem já não pegou um corredor? Aquele vendedor que está sempre na porta da loja e quando você pergunta por um item, ele dispara e ignora seu percurso dentro da loja, não vê seus olhos ou mãos enquanto você caminha pela loja, e te conduz linearmente direto ao produto desejado, finalizando a compra o mais rápido possível, focado em voltar para sua vez de atendimento, enquanto um enorme potencial e sinais de compras são desperdiçados porque a pobre criatura não vem com olhos de alta definição funcionais nas costas, junto aos ombros, que lhe permitisse ver tudo que não viu enquanto corria pela loja. É um erro crasso ignorar os sinais de comprador dentro de uma loja.
O que dizer do guarda-costas? Ele evita a qualquer custo que você toque no produto. Sua vez de atendimento depende disso. Cada vez que o cliente toca um produto, sua vez de atendimento se encerra e ele ao invés de usar umas das ferramentas mais fortes de vendas, que é entregar o produto ao cliente para que este experimente a posse, ele cerceia porque acredita que você não vai comprar nada!
O julgador é outro tipo comum, quase uma variação do guarda-costas. Ele tem sensores paranormais que lhe permitem, em um único olhar, em centésimos de segundos apenas, definir seu potencial de compra e age rapidamente corrigindo as ofertas. Oferece parcelamento e descontos em uma só dose. Apresenta produtos inferiores ao que você pediu, lembra que o processo de concessão de crédito pode ser forjado com comprovantes suspeitos e referências fajutas. Ele erra ao julgar o cliente e erra ao mostrar-se tão incompetente para vender. Por não saber vender, vende preço; por não saber ouvir, julga antecipadamente.
E o cíclico? Gagueja sempre que é questionado. Tem um argumento predefinido que se baseia e se restringe a "vende muito” e "é ótimo”. Sem capacidade de argumentar, roda em círculo e, como uma bolinha de pingue-pongue, bate e volta e não consegue sustentar sua venda. É um profundo conhecedor de seu desconhecimento, mas altamente acomodado nisso. Vende quando encontra alguém muito pior que ele, que se satisfaça com um processo tão raso ou quando encontra alguém absolutamente decidido, que sabe o que quer e compra apesar dele.
Dá para falar horas, dias, sobre vendedores ruins, mas nenhum é pior que o indiferente. Frustrado, vai arrastado todo dia para seu trabalho, arrependido de ser vendedor. Aquele que não consegue se orgulhar de fazer parte de um resultado, de uma equipe, de um propósito. JC Penny tem uma frase que gosto muito, que diz: "Dê-me um funcionário de estoque com um objetivo, e eu lhe darei um homem que vai fazer história. Dê-me um homem sem um objetivo, e eu lhe darei um funcionário de estoque”. Parafraseando-o, vejo o vendedor. Sem objetivo será alguém triste, incapaz, indiferente, que por mais que aquela venda seja importante para você, ele, vendedor, jamais poderá fazer parte deste resultado, porque simplesmente não se importa com você, com a empresa, não se importa consigo mesmo.
Este certamente é o pior dos piores para se ter em uma empresa, pois seja qual for sua motivação para comprar, vale muito mais do que este vendedor.
Roberto Mendes é publicitário, especialista em marketing pelo Instituto de Administração
e Gerência da PUC-Rio, pós-graduado em Engenharia Ambiental, professor titular
da Universidade Candido Mendes e sócio da Target Comunicação
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