Janelas partidas, cidade partida, tolerância zero

quinta-feira, 09 de maio de 2013

O comportamento humano é pauta de marketing, não entendê-lo é negligenciar qualquer chance das ações serem eficientes minimamente. Assim, pensar o comportamento e o efeito das ações é prioridade na gestão de qualquer coisa, seja privada ou pública. 
Em nosso país a coisa pública assume um perigoso entendimento de que não é de ninguém em vez de assumir o importante papel de ser de todos. Assim cuidar da coisa pública raramente interessa a qualquer um, principalmente ao próprio poder público, pois despertar zelo pelo que é público é plantar a semente de que o orçamento público também merece ser cuidado, e como muitas vezes esse patrimônio é regido e disputado por pessoas interessadas em seu bem próprio e não na eficiência do poder público, o pernicioso ciclo se reescreve e o abandono se instala. Mas o que tem isso a ver com marketing!? Tudo! Vejamos...
Em Stanford, famosa universidade americana, há mais de 40 anos atrás foi realizado um estudo de psicologia social que buscava entender o comportamento das pessoas, seus espelhos sociais e compreender as espirais virtuosas e viciosas. Para realização da experiência o pesquisador deixou dois carros de cor e modelos idênticos em dois bairros da cidade, um bairro pobre e outro rico. O carro no bairro pobre fora depredado e saqueado imediatamente, combinando com o abandono do local. O do bairro rico permaneceu intocável também reproduzindo a conduta padrão naquela localidade. Então, o pesquisador quebrou o vidro do carro, dando finalmente um sinal de abandono. Imediatamente o ciclo de destruição se iniciou e pouco restou do carro, igual ao que acontecera no bairro pobre. 
Assim nota-se que não é pobreza que determina o comportamento, mas o sentimento de participar daquela comunidade e sobretudo o sentimento de que a comunidade participa, também, da vida do cidadão. Lembrou-se de nossa cidade!? 
Assim percebemos o link imediato com gestão pública e marketing social.
O cidadão responde à cidade como uma criança mal-educada responde aos pais. Cabe ao pai dar parâmetros e limites, cabe ao poder público fazer o mesmo.
Tolerância zero é a ferramenta para quebrar ciclos viciados em desrespeito, descaso, mau uso do dinheiro, do equipamento, da estrutura, do poder público como um todo. O trânsito, o orçamento, o patrimônio, só serão respeitados quando os envolvidos neste processo entenderem que janelas quebradas não são permitidas. 
Cortar na própria carne é a única chance que temos de criar uma espiral virtuosa. A permissividade dada ao cidadão de estacionar sob a placa de estacionamento pago, sem pagar, o estimula a estacionar na de proibição, que o encoraja a estacionar em fila dupla, que por sua vez o ensina a estacionar sobre a calçada e por fim o faz estacionar em qualquer lugar sem ligar a seta e sem se importar com o dano a todos os outros que causa, pois este cidadão é vitimado seguidamente por tantos outros cidadãos vitimados. 
Cada carro estacionado errado é um vidro que se quebra e que reafirma que é permitido transgredir. É papel do poder público conter comportamentos, individuais ou não, lesivos ao interesse coletivo. 
Esta teoria, a das janelas partidas, foi utilizada com sucesso em vários lugares do mundo, e a mais emblemática foi Nova York com Rudolph Giuliani, que tirou NY das manchetes do crime e transformou Manhattan num dos lugares mais seguros para se caminhar. 
Mas, a pergunta que fica, para nós e nossa cidade, é: interessa ao poder público, a todas as suas instâncias e representantes, instituir respeito à coisa pública? 
De modo geral o que vemos é uma ou outra conduta isolada que se limita a colar os cacos, ficando vidros rachados, estilhaçados e dedos cortados, e fica a pergunta: até quando?
Respeitar, zelar, cuidar e proteger dão forças a todos para nos sentirmos parte de algo muito maior do que das tantas quadrilhas que se articulam por corredores públicos. 
Faz nos sentir muito mais importantes que donos de nossas casas, e nos eleva a donos de nossas ruas. Transforma-nos, não em consumidores sem voz do que é público ou de ninguém, mas nos promove a sócios do algo muito maior e poderoso, chamada nossa cidade.

Nota: Zimbardo, Phillip 1969, Universidade de Stanford (EUA) – Broken windows theory

“Roberto Mendes é publicitário, especialista em marketing pelo Instituto de Administração e Gerência da PUC-Rio, pós-graduado em Engenharia Ambiental, professor titular da Universidade Candido Mendes e sócio da Target Comunicação.”

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