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Publicidade e mau gosto
quinta-feira, 07 de março de 2013
Qual o limite entre impactar e chocar? Qual o limite entre o “falem de mim” e o “falem mal de mim”? Se esse dilema não parecia óbvio de resolver, a internet, ao que parece, só piorou as coisas.
Cada vez mais as marcas tentam invadir a mídia internet e sua vastidão parece assustar tanto que a busca por views parece permitir que empresas, produtos, marcas e prestadores de serviço usem ações que ultrapassam o direito das pessoas, atropelam os limites éticos e sociais, e ignorem as estratégias de longo prazo, tudo em troca contadores no YouTube.
Vejamos alguns exemplos: A marca Nívea montou, em um aeroporto da Alemanha, um backstage para poder fotografar passageiros à espera de seus voos, imprimir capas de falsos jornais, com a foto tirada sem permissão, onde a imagem figurava com o dizer: procura-se, fugitivo da justiça, e simultaneamente, as TVs do aeroporto mostravam um, também falso, telejornal, onde a mesma foto, com detalhes da descrição da pessoa e um contundente áudio narrava sua periculosidade, e após essa pessoa chegar a níveis (sem trocadilho com Nívea) de estresse inimagináveis, policiais a encontravam e abriam uma mala, com o novo produto na fábrica de cosméticos, um desodorante antitranspiração por estresse. Imagine-se nessa situação, sente-se confortável? Apaixonado pela marca?!
Em outro caso, a não menos conhecida Adidas montou em uma loja de shopping um falso provador, onde um espelho de fundo falso invadia a privacidade de consumidores que ali trocavam de roupa, para que após colocarem a camisa de um time europeu (o Ajax), tinha o falso espelho aberto e uma imensa torcida comemorando com o consumidor sua escolha. Mulheres, homens, crianças e jovens eram expostos a diversos olhares e câmeras, sem uma pré-anuência dos consumidores, e seu momento de privacidade vigiado, invadido. Como você se sentiria diante disso? Imagine sua filha ou esposa.
Para citar exemplo nacional, a Cia. Athletica, academia de São Paulo, pôs falsos fiscais da prefeitura, onde obesos eram parados por tais fiscais e interpelados sobre a legislação que proíbe o uso de outdoors na capital paulista. E que diante da dimensão de tais obesos, seriam multados por equivalerem a outdoors ambulantes, por possuírem logotipos imensos em suas camisas imensas, segundo a ótica desta academia de ginástica. As reações passavam por tentativas de fuga, briga e ofensas, tudo isso para produzir um viral na internet, acreditando que desta forma a marca seria melhor vista, afinal havia uma apologia, disfarçada no constrangimento e menosprezo aos obesos, ao conceito do “fique em forma”, e acredite, a ação foi assinada por uma agência de renome.
O grande debate é descobrir como limitar até onde uma ideia tem permissão de ir, até onde a sociedade vai apoiar comportamentos baseados em constrangimentos, menosprezo, ofensas veladas e a perpetuação da sensação que A é melhor que B, independente da crença, limitação, desejo ou qualquer outro valor pessoal ou de um dado grupo.
Há pegadinhas onde o consumidor é convidado a participar, quer seja ao entrar em uma tenda, apertar um botão, preencher um cupom, mas tantas outras onde ele é pego absolutamente de surpresa ou pior, em sua intimidade ou sendo usado como bucha no fogo das vaidades e crenças negativas, bem mais antigas que as marcas que tentam perpetuá-las.
A melhor resposta deve vir do consumo, eu espero, do direito ainda vigente de escolher marcas, produtos, serviços e empresas que compartilhem de valores, comportamentos e prioridades semelhantes aos nossos, permitindo assim que a internet cumpra sua melhor possibilidade, a de trazer mais conhecimento, entretenimento, riqueza e respeito.
“Roberto Mendes é publicitário, especialista em marketing pelo Instituto de Administração e Gerência da PUC-Rio, pós-graduado em Engenharia Ambiental, professor titular da Universidade Candido Mendes e sócio da Target Comunicação.”
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