Colunas
As cotas, a qualidade da educação e a acessibilidade
quarta-feira, 12 de setembro de 2012
O Senado Federal acaba de aprovar projeto de lei sobre as cotas raciais e sociais, reservando 50% das vagas nas universidades públicas para quem se enquadrar nesse perfil.
A imprensa dá conta de reservas por parte de alguns educadores a respeito da aplicação da lei, sobretudo porque alegam que ela fere a autonomia universitária. A autonomia, na realidade, pode transformar uma universidade num feudo educacional, o que seria uma exorbitância. Por mais importante que seja uma universidade pública, ela sobrevive de verbas federais colhidas dos impostos pagos pelos cidadãos. Ela não tem autonomia econômica. Deveria ter uma autonomia no que tange aos aspectos acadêmicos e de pesquisa pela especificidade do assunto. Essa propalada autonomia só serve para proteger, ao lado de muitas intenções justas, uma série de irregularidades como o não comprimento dos tempos integrais e dedicação exclusiva dos docentes.
A outra vertente de críticas às cotas sociais e raciais é que a lei retira da classe mais abastada do país 50% das possibilidades de cursar um ensino superior gratuito. Esta classe pode pagar muito bem um ensino básico e médio com mensalidades elevadas, além de complementos educacionais que caracterizam um tempo integral de formação antes dos vestibulares. É um engodo pensar que a gratuidade das universidades públicas favoreça a todos. Na verdade só favorece aos ricos.
Para encarar esta situação precisamos pensar que a democracia só se instala verdadeiramente quando todos têm possibilidades de acesso, o que hoje é negado pela baixa qualidade da educação pública. E não digam que é falta de dinheiro, porque a péssima gestão é mais responsável. Então, já que não temos qualidade na escola pública básica e média, o modo de reduzir a pressão social é criar cotas, o que pode significar um grande perigo: a manutenção da baixa qualidade da escola pública dado que “cobre-se o sol com a peneira” através da ilusão das cotas.
Cotas sociais e cotas raciais, como engajamento na defesa dos menos favorecidos por questões históricas neste país, só terão sentido se forem temporárias e atingirem todos os pobres de todas as raças. Perpetuadas, acabarão por desmantelar de vez o sistema educacional público pela permanência do sucateamento das condições de trabalho, dos salários dos professores e dos meios para melhorar os laboratórios e bibliotecas. Para que, seria perguntado, melhorar as escolas se, no futuro próximo, as cotas acalmam as pressões sociais?
Precisamos de cotas contanto que sejam temporárias e vigorem o tempo necessário para que seja reestruturada a escola pública, tornando-a de qualidade como exige a Constituição Federal de 1988.
O tempo integral permitirá um real aprendizado dado que em aula não se aprende, só se entende! Aprender depende de exercício diário que a escola pública não oferece. Os pais dos alunos das escolas particulares oferecem este aprendizado extra aos filhos. Aí está a diferença. Mas, pasmem-se leitores, mesmo o Governo Federal enviando ao Congresso Nacional o II PNE com vigência até 2020 e indicando que todas as escolas públicas do país deveriam atingir tempo integral em 50% de suas unidades, os nossos representantes, imediatamente e colaborando com a desqualificação, já criaram uma emenda reduzindo este número para 25%.
Quem ganha com isso, ganha de modo aparente e, quem perde é a classe mais abastada que terá de migrar com 50% de seus filhos para a escola particular paga. O país perderá porque investe no ensino superior e joga fora este investimento porque não preparou devidamente a metade dos candidatos.
Temporariamente não representará dano expressivo, mas com a morosidade será derrubada a meritocracia em todos os níveis do ensino. Assim, conclui-se que terão emprego os que cursarem o ensino público superior sem serem cotistas e os que conseguirem pagar as escolas particulares. E o grande engodo pode terminar quando concluírem que estas manobras podem fazer com que o pobre continue pobre!
Prof. Hamilton Werneck é pedagogo, escritor e palestrante
Hamilton Werneck
Hamilton Werneck
Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.
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