Vergonha saudável e vergonha tóxica

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Há a vergonha saudável e a tóxica. A tóxica destrói a vida, é uma experiência muito dolorosa, uma ferida profunda, sentida dentro de nós, nos separa de nós mesmos e dos outros, nos faz rejeitar a nós mesmos, e esta rejeição requer um disfarce, uma dissimulação, você a encontra no doutor e no iletrado, no rico e no pobre, no poderoso e no impotente.

O sentimento saudável de vergonha, por outro lado, nos ajuda a compreender que somos limitados como seres humanos. Nenhum ser humano tem ou poderá ter algum dia um poder ilimitado. A limitação é nossa natureza fundamental. Não aceitar isto, produz muitos problemas psicológicos e sociais.

A vergonha saudável nos ajuda a perceber nossos limites. Nos mantêm firmes, auxiliando-nos a ver a luz amarela que indica nossa limitação. Nos mostra que não somos Deus, que cometemos erros, mesmo sendo sábios, e cometeremos outros erros, mesmo nos tornando mais sábios. Daí, precisamos de ajuda. Você aceita isso? Aceita sua limitação? Ou tem vergonha de ter vergonha? Vergonha aqui significa limitação, falhas, erros. Não é vergonhoso cometer falhas quando fizemos o nosso melhor. Mas repetir os mesmos atos errados e esperar resultados melhores, isso é insanidade.

Nossa vergonha saudável nos ajuda porque ela ao nos ajudar a conhecer melhor nossos limites – o que podemos e o que não podemos – evita que nos desgastemos indo em busca de metas que não podemos alcançar, ou fazer coisas que não podemos mudar.

Cada ser humano precisa de outro ser humano. Você não teria chegado aonde chegou se alguém não tivesse lhe ajudado.

Crianças muito pequenas e ainda indefesas para saberem fazer certas coisas, podem ter recebido de pais nervosos, bombardeios: “Vamos lá, seu (sua) vagabundo (a), levante da cama e vá comprar pão na padaria!”. E se tornaram crianças assustadas, e desenvolveram uma vergonha tóxica. Mas o pai ou mãe que teve um pai ou mãe também desumanos que fazia a mesma coisa, levava a repetição da mesma história de dor, medo, susto. Não estava errado aquela criança ter medo de comprar pão sozinha na padaria porque ela ainda era pequena. Então, a criança passava a ser obrigada a ter de dissimular a vergonha e a insegurança, se rejeitar (porque sentir que a insegurança era um erro seu), e passar a ter uma vergonha tóxica, com medo que era debochado pelos adultos, ajudando, assim, a destruir sua autoestima.

John Bradshaw no seu livro Curando a Vergonha que Impede de Viver, página 24 diz: “Não podemos vencer sozinhos. Nenhum ser humano pode. Mesmo depois de termos alcançado algum senso de domínio, mesmo quando somos independentes, ainda teremos necessidades. Precisaremos amar e crescer. Precisaremos nos preocupar com outras pessoas e precisaremos de que necessitem de nós. Nossa vergonha funciona como um sinal saudável de que precisamos de ajuda, e de que precisamos amar e manter um relacionamento carinhoso com outras pessoas. E acrescenta: “Nossa vergonha saudável é a base psicológica da nossa humildade.” (p.26). Ser humilde não é ser pobre materialmente. É reconhecer nossas limitações e ficar de bem com a vida apesar disso.

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César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

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