Vai ser assim até o fim?

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Gostaríamos que o ideal existisse em nossa vida. Isto é normal. Mas pode também não ser. Podemos querer que o ideal seja conforme o nosso desejo, especialmente quanto ao que uma pessoa é ou se comporta em nosso relacionamento com ela. Não há o ideal, que sempre é um alvo, em relação a muitas coisas, não alcançadas nesta vida.

Todos nós, se estamos com relativo equilíbrio emocional, não podemos deixar de notar os defeitos das pessoas com as quais mais convivemos. Claro, elas também observam nossos defeitos de caráter. Mas parece que o pior disto não é conviver com pessoas que possuem defeitos no comportamento que nos machucam, muito ou pouco, porque todos os possuímos, mas é conviver com as que negam tê-los. 

Estas são pessoas muito defensivas, usam bastante a negação que é uma forma de fugir da verdade. Escrevi recentemente sobre isto e expliquei que se a pessoa foge sempre da verdade, por permanecer na negação, se autojustificando o tempo todo, então não tem jeito de o relacionamento funcionar bem.

Você tem que querer a verdade para que ela tenha efeito em sua vida. A verdade aceita por nós sempre vai acabando com as nossas mentiras. Mas tristemente não é muito fácil encontrar pessoas hoje que realmente queiram a verdade. Não a querendo, se tornam corruptas, mentirosas, manipuladoras, trapaceiras, e isto perturba toda a sociedade e não só um relacionamento pessoal.

Conversei com um senhor com mais de 80 anos, lúcido e com ainda boa autonomia na vida, e o tema era a solidão. Este assunto surgiu porque eu o havia perguntado como ele vinha se sentindo vivendo sozinho em sua viuvez. Ele me disse que o pior era a solidão. Comentei que há vários tipos de solidão, e uma bem difícil tem que ver com a convivência com as pessoas que pensam bem diferente, lidam com as emoções de modo descontrolado, geralmente justificando isto com negação da verdade psicológica, têm visão da vida muito diferente da sua, constituindo um jugo desigual ideológico.

Não que as diferenças sejam ruins em si e obrigatoriamente provoquem solidão, mas o sofrimento neste contexto ocorre quando a visão de vida de um não tem a mesma pequenez, falta de sentido e superficialidade como a de uma pessoa vazia com quem se convive.

Vai ser assim até o fim? Talvez sim, porque não conseguimos mudar as pessoas. Algumas não mudarão nunca. Por que esta rigidez? Não sei. A medicina e a psicologia não conseguem explicar tudo. Diante disto ou você se afasta da pessoa, não necessariamente de forma física, mas no seu mundo interior, aprende a lidar com a frustração, e se fortalece para continuar vivendo com ela, ou rompe de fato o contato.

O que pode ajudar a convivência dentro da frustração de que o outro não é o ideal que você sonhou (alguém é?), tem que ver com evitar manter em sua mente a lembrança dos atos desagradáveis e injustos dela, cultivar a humildade e desconfiar de si mesmo porque você também é falho, também frustra as pessoas.

Precisamos ter paciência com as faltas das pessoas. Isto pode nos tirar do egoísmo e nos dar um coração com longanimidade e generosidade, entendendo que vai ser assim até o fim. Você e a outra pessoa com limitações que várias circunstâncias da vida produziram.

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César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

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