Uma experiência com Deus na vida de um alcoólico agnóstico

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Estou terminando de ler o livro “Despertar Espiritual”, publicado em 2011 pela Junta de Serviços Gerais de Alcoólicos Anônimos do Brasil. Trata-se de um conjunto de histórias reais de membros de Alcoólicos Anônimos (AA) que percorreram “da escuridão do alcoolismo para a plenitude da luz.” Há relatos de ex-freira, padre, pastor, índio, professor universitário, judeu, ateu, agnóstico, sobre a experiência deles com o despertar espiritual adquirido em AA. Várias dessas histórias me tocaram e em especial há uma que gostaria de compartilhar aqui, e que está nas páginas 185 até 187 desse livro.
Um membro de AA sofreu acidente grave após 15 anos e meio de sobriedade, tendo queimaduras em mais de 47% do corpo. Ao ser levado ao hospital, foi dito à esposa dele que ele teria apenas 10% de chance de sobrevivência. Ele não soube disso. Sentia uma dor muito intensa toda vez que respirava. Parece que só existia a dor. Nada adiantava para ela passar, nem ouvir rádio, ler um jornal, etc.
Até ali ele era um dos agnósticos (não acreditava em Deus mas admitia que Ele poderia existir) dos grupos de AA naquela cidade. Ao chegar uma pessoa no grupo em que ele estava presente com dúvidas se poderia participar do programa de AA mesmo não crendo em Deus, esse agnóstico era citado como exemplo.
Lutava na cama do hospital para sobreviver e em sua mente vinham conceitos que havia aprendido em AA, que repetia para si mesmo, como: “Seja feita a Tua vontade”, “Isso também passará”, etc. Algumas vezes parecia que o cérebro dele queria desligar de vez, havia momentos de vazio, de “branco”.
No quinto dia de internação, uma enfermeira que sabia que ele era de AA, trouxe a seu quarto um rapaz com um braço gravemente queimado. Mas aquele homem com dor intensa no corpo todo nem conseguia prestar a atenção na fisionomia e no nome do rapaz. Eles ficaram sozinhos e o jovem começou a contar a história dele, falando que tinha grave problema de alcoolismo, havia tentado AA sem adiantar. Logo o homem pensou: “Por que não me deixam em paz? Por que me trazem o Pat (nome do rapaz) para falar de problemas?”. Pat descreveu seu problema com o álcool. Disse que já podia admitir ser um alcoólico. Daí o assunto se voltou para a entrega do problema a um Poder Superior. Ambos discutiram por algum tempo sobre a necessidade de um Poder Superior para ajudar.
O homem não tinha ideia de quanto tempo conversaram, mas percebeu que em algum momento a dor sumira! Enquanto Pat estava ao lado de sua cama a dor havia sumido e depois voltou intensa de novo quando ele foi embora. E pensou: “Ficou claro que o que eu devia fazer para parar de doer era participar na vida dos outros”. Daí em diante, ele abria o coração com sua esposa, e a enfermeira marcava pequenas reuniões com ele e pessoas do hospital que estavam em AA. Disseram que estava pronto para ser convertido na crença em Deus. As explicações de membros de AA sobre Deus atuar na vida delas, para ele eram experiência pessoais deles. Mas ali no leito hospitalar ele teve aquela experiência espiritual inegável. E disse: “Mesmo se quisesse, eu não poderia ignorar a mensagem. Havia um Deus em minha vida, pacientemente esperando para me mostrar a sua graça, a sua misericórdia, a sua beleza inúmeras vezes... É como se ele dissesse: ‘Devolverei a sua vida e sua sanidade por meio de outro alcoólico’”.
Um ano após o acidente que o queimou, numa reunião de AA, um jovem animado se aproximou dele e disse: “Se lembra de mim?”. Ele não se lembrava, mas sentia ser um rosto familiar. O rapaz se apresentou como Pat dizendo que comemorava um ano de sobriedade. Falou do acidente em que queimou um braço, e que quando a enfermeira fazia o curativo, ele comentava com ela sobre os problemas com a bebida. Daí ela apresentou Pat ao homem queimado. Só que enquanto a enfermeira conduzia Pat ao quarto, ela pediu para não demorar muito porque aquele homem estava morrendo por causa das queimaduras graves. 
Na próxima reunião de AA, esse homem disse: “...conversei com Pat e acho que ele não acreditou na minha convicção que ele era o instrumento pelo qual Deus começou a salvar a minha vida. Pat ainda acredita que fui eu quem o ajudou a aceitar os Doze Passos!”. 

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César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

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