Sofrimentos emocionais, sensibilidade e infância

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Estudos (Aron 2005) têm descrito que há uma interação entre a sensibilidade ao processo sensorial e fatores negativos no ambiente infantil que conduzem para problemas afetivos como medo, ansiedade e depressão, o que, por sua vez, promovem a timidez. Sensibilidade ao processo sensorial é uma característica individual na qual aqueles que a possuem são mais sensíveis aos estímulos sutis do ambiente (barulho, sirene, etc.), são facilmente superestimulados pelos eventos do exterior, tendem a parar para verificar as coisas numa situação nova para eles e preferem pensar e revisar suas ideias após uma experiência.

Cerca de 20% da população em geral é de pessoas com esta sensibilidade ao processo sensorial, chamadas de “pessoas altamente sensíveis” (HSP – Highly Sensitive Person). Esta característica tem sido descrita não como uma doença ou transtorno, mas como um traço de personalidade. Alguns autores usaram termos diferentes para isto, como inibição (Kagan 1994), timidez inata ou infantil (Cheek & Buss, 1981; Daniels &  Plomin,1985), reatividade (Rothbart, 1989; Strelau, 1983), limiar de capacidade de resposta

(Thomas & Chess, 1977). Segundo Stelmack e Geen (1992), existe considerável evidência científica de que os introvertidos são mais sensíveis aos estímulos físicos do que os extrovertidos.

Genericamente podemos dizer que existem dois estilos de comportamento porque existem duas estratégias de sobrevivência que seriam herdadas: um tem que ver com processar as informações completamente antes de agir, e outro se relaciona com agir imediatamente. A ciência vinha descrevendo que a pessoa altamente sensível parecia não ter herdado este traço de sensibilidade, o qual simplesmente teria aparecido cedo em sua vida. Porém, estudos mais recentes têm encontrado (estudos sobre genes alelos) informações que parecem indicar que este traço seria herdado.

Se estas pessoas altamente sensíveis processam todas as experiências mais completamente, incluindo experiências sociais e emocionais, elas também teriam sido especialmente afetadas pelo ambiente na sua infância. As pessoas altamente sensíveis que sofreram problemas na infância, como alcoolismo na família e outros fatores estressores, definiram a infância como infeliz, ao passo que as pessoas sem este traço de sensibilidade não relataram a infância como tendo sido ruim. Então, os estudos sobre este traço sensível de personalidade sugerem a existência da possibilidade de existir um modelo geral de interação entre a sensibilidade do temperamento e a história de muitos fatores estressantes que conduzem à sofrimentos afetivos crônicos.

Hagekill (1996) encontrou em seus estudos que crianças com o traço de temperamento de baixa sociabilidade agiriam assim por conta de eventos negativos na vida, e que se tornariam mais medrosas em anos posteriores. Cientistas como Gunnar e colegas (1994 e 1996) pesquisaram em laboratório experimentos com crianças vivendo situações novas para comparar a reação das crianças inibidas e não-inibidas com ou sem vínculo seguro com a mãe. Encontraram que as crianças inibidas em geral (independentemente do tipo de vínculo de segurança), entraram gradualmente em situações novas (ao invés de entrarem de cabeça) e tiveram reações produzidas pela adrenalina (hormônio do estresse). Entretanto, somente aquelas crianças com vínculo inseguro mostraram um aumento do cortisol (também um hormônio do estresse). Níveis altos de cortisol no sangue contribuem para o desenvolvimento de distúrbios do sono, os quais levam à maior vulnerabilidade aos afetos negativos (medo, ansiedade, depressão), especialmente nas crianças (Weissbluth, 1989). Pesquisadores concluíram que existem dois caminhos que conduzem à hiper reatividade do sistema adrenocortical (liberação de hormônios do estresse gerando ansiedade e depressão): tipo de temperamento e cuidado maternal deficiente no início da vida da criança.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que as doenças mentais são doenças crônicas das crianças e dos adolescentes. O que isto significa? Significa que se você é adulto e hoje sofre de depressão, transtorno de ansiedade (pânico, fobia, transtorno obsessivo-compulsivo, etc.), ou outros sofrimentos psicológicos, possivelmente as causas principais estão lá no seu passado infantil, talvez acrescentadas de sofrimentos da vida adulta e sensibilidade alta. Assim, a resolução não é simples porque pode ter uma história de dor emocional antiga e profunda talvez numa pessoa com um processamento sensorial muito sensível. 

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César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

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