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Qual o padrão de normalidade para o funcionamento da comunicação verbal no casamento?
quinta-feira, 29 de maio de 2014
Homem e mulher são diferentes psicologicamente. A maneira como o cérebro de um funciona é diferente da maneira do outro. A experimentação das emoções ocorre de modo distinto nele e nela. Há maridos afetivos e há esposas frias. Há maridos muito racionais e há esposas muito emocionais. Há homens que têm ternura e há mulheres "broncas”.
Parece que a mulher precisa da conversa para estar na vida de modo saudável. Parece que o homem precisa pensar sozinho para estruturar sua conduta. Será que existe um padrão de normalidade entre ser racional por um lado e ser emocional por outro, que possa ser usado para medir o equilíbrio emocional entre homem e mulher no casamento?
Ricardo está casado com Rute (nomes fictícios, mas a história é real) há dez anos. Ele é mais calado, vindo de uma família sem comunicação afetiva, e manifesta seu afeto por Rute através de companhia, levando-a e buscando-a no trabalho dela, saindo para comer fora, tomando refeições juntos durante a semana, ajudando a esposa a cuidar da casa lavando louça e arrumando coisas, gosta de estar com ela, gosta de ter sexo com ela, mas não alimenta muito a conversa com sua esposa, dizendo não ter muito assunto.
Rute veio de uma família com muita comunicação. Muito ligada com os pais a ponto de pedir ao marido para mudar de cidade (onde ele era bem-sucedido profissionalmente) para outra, onde moram os pais dela. Ele fez isto. Fez por amor a ela. Ela gosta muito de estar com os pais na casa deles e, quando vai lá com o marido, há muita conversa. Ela senta e conversa direto duas ou três horas com os pais. Já Ricardo se sente incomodado com tanto assunto. Vez ou outra levanta, dá uma volta, e depois retorna, e eles estão lá conversando.
Ricardo marcou uma consulta comigo. Ele quer melhorar. Quer resolver os problemas de comunicação no casamento. Reconheceu que tem algumas dificuldades nisto, por isso tomou a iniciativa de procurar ajuda, o que é mais comum a mulher fazer. Esteve disposto a entender os problemas pessoais e do casal, na medida em que conversávamos na consulta, mantendo a mente aberta para entender a verdade. Deu para perceber claramente o interesse dele pela esposa e por querer encontrar melhor harmonia. Ele não estava defensivo, pelo contrário; estava disposto a aprender. Isto é amor pela esposa.
Qual o padrão correto de conduta em termos de comunicação neste casal? Ricardo tem que adotar o padrão de Rute, que é conversar muito? Ele tem que desenvolver um padrão de conversa, como a família de Rute? É Rute que tem que diminuir estas exigências de diálogo frequente e se adaptar ao modelo de Ricardo, sem muita conversa? Quem é o modelo de sanidade neste formato tão comum de casamentos?
O que Rute sente quando seu marido não mantém a conversa, como os pais dela fazem? Se sente rejeitada? Sente que ele não liga para ela? Será ela rejeitada por um marido que cuida da casa, faz comida, decide procurar ajuda para melhorar o casamento, gosta da companhia dela, toma refeições diariamente com a esposa, gosta de sexo com ela, mudou de cidade para ela ficar mais perto dos pais, etc.? Será correto Rute querer que o padrão normal que deve imperar no casamento é o modelo de comunicação da família dela? Ricardo admitiu na consulta que ele tem dificuldade em manter uma conversa por muito tempo. Mas será que Rute admite que ela tem dificuldade de ficar um tanto sozinha e aprender a refletir, meditar, e se sentir bem sem obrigatoriamente ter que estar sempre conversando com o marido ou com os pais dela?
Por que Rute, saindo de uma família de origem onde há abundante comunicação verbal, se casou com uma pessoa mais fechada? Por que Ricardo, saindo de uma família onde havia fraca comunicação verbal, veio a se casar com uma mulher que quer muita conversa? O que será que cada um necessita aprender com o outro?
Neste contexto de comunicação no casamento, quem é o padrão de normalidade, Rute ou Ricardo? Ou nenhum dos dois? Você aceita que não é padrão perfeito no seu casamento? Aceita que ninguém é? Ou ainda nutre a fantasia de "alguém lá fora” que fará você feliz porque seu cônjuge não é o padrão e não satisfaz você plenamente? Você é padrão perfeito para seu cônjuge? Sabe do que ele (ela) sente falta num(a) companheiro(a)? Ou se sente um(a) semideus(a) perfeito(a), que não precisa mudar nada, não precisa desenvolver nada, não precisa se controlar em nada?
Ter facilidade de conversar e de nutrir sentimentos não são garantias ou padrão de amor maduro. Pessoas introvertidas, que também gostam de estar sozinhas, que não precisam ficar falando o tempo todo para se sentirem alguém ou amadas, podem ter melhor capacidade de amar maduramente do que as pessoas muito emocionais e tagarelas.
Cesar Vasconcellos de Souza
Saúde Mental e Você
O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.
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