Psicopatia: onde está o remorso?

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Parte 1

A revista Mente Cérebro, ano XX, n.º 254 publicou um artigo intitulado "Dentro da mente das pessoas sem culpa”, abordando o assunto da psicopatia segundo os neurocientistas Kent Kiehl, da New Mexico University, e Joshua Buckholtz, da Vanderbilt University, sendo este último um estudioso dos fatores de risco genéticos que predispõem ao comportamento antissocial e aos desejos compulsivos. 

Psicopatas têm grave dificuldade de sentir empatia, não percebem seus sentimentos e nem os dos outros, são mentirosos, manipuladores sem culpa, não sentem remorso pelas atitudes violentas que praticaram, não desejam mudar de comportamento, transgridem mais cedo na vida, sendo mais violentos e com mais frequência do que as outras pessoas, têm emoções superficiais, não se incomodam em abusar das pessoas, não são leais, rompem uma relação de amizade, na qual havia manipulação e não afeto genuíno, como alguém troca de camisa, têm dificuldade de fazer um juízo correto sobre valores morais e éticos, "podem cair na criminalidade por capricho, envolvendo-se em falsificações, furtos, assaltos e até assassinatos.”(p.35), não controlam seus impulsos, são especialistas em descobrir e explorar a fraqueza dos outros. Será que isto ocorre em pessoas nos poderes sociais em nosso país que, cinicamente, se dizem inocentes? Kielh e Buckholtz afirmam que os psicopatas "reincidem da criminalidade quatro a oito vezes mais [que os não psicopatas]”(p.34).

Um psicopata geralmente é uma pessoa bem aparentada, não é um indivíduo meio  "monstro” com uma face esquisita, que dá medo. São envolventes, a ponto de os neurocientistas acima citados verificarem que os jovens psicólogos ainda inexperientes que entrevistavam presidiários psicopatas não percebiam a lesão do caráter destes indivíduos, e achavam que pudessem ter sido presos por engano. "[os psicólogos estudantes da pós-graduação] Pensavam assim pelo menos até lerem suas fichas [dos presidiários], das quais constavam crimes como exploração de mulheres, tráfico de entorpecentes, fraudes, roubo, furto e por aí vai.” (p.33).

Muitos psicopatas têm, portanto, uma aparência falsa de normalidade, e geralmente não têm sintomas típicos de psicóticos, como alucinações e delírios, e nem apresentam tristeza, ansiedade alta, desorientação no tempo e no espaço assim como confusão sobre sua identidade, fatores estes presentes em algumas doenças mentais. Socialmente eles parecem normais, e estão entre estudantes, profissionais de várias áreas, e geralmente são mais inteligentes do que a média das pessoas.

Psicopatas parecem sofrer de alteração biológica, sendo que a vivência de uma infância complicada (nem sempre) e, ao meu ver, os fatores espirituais também influenciam seus comportamentos fraudulentos, agressivos, cínicos, sem culpa, sem remorso. Parece que o cérebro deles processa o aprendizado com um defeito que acaba prejudicando gravemente o aspecto emocional. 

Segundo Kiehl e Buckholtz, "os psicopatas merecem tratamento como qualquer pessoa com outras doenças mentais...”(p.34). Grave dificuldade deles é também a impossibilidade de identificar os sentimentos dos outros e avaliar corretamente as expressões faciais das pessoas, por exemplo, quando alguém tem uma face de medo. 

Estudos com eletroencefalografia (EEG) com pessoas normais comparados com o EEG de psicopatas mostrou que ondas cerebrais incomuns surgiam nos exames dos psicopatas e tais ondas eram mais ou menos iguais quando eles eram expostos a palavras com forte significado emocional e palavras neutras emocionalmente, enquanto nas pessoas "normais” as ondas cerebrais mudavam drasticamente quando liam uma palavra com forte conteúdo afetivo. (p.35).

"Uma vez fixados numa meta, os psicopatas seguem em frente como burros de carroça que não podem olhar para os lados. Essa tendência de concentração bitolada associada à sua impulsividade pode produzir o tipo de horror descrito em A sangue frio, uma sequência de torturas durante uma noite inteira... [em] criminosos que, ... ficaram cegos e surdos para qualquer informação que pudesse detê-los, como os apelos das vítimas.”(p.36). 

Veja a parte 2 dessa matéria na semana que vem.


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César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

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