O sonho acabou—A desidealização do outro no casamento

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Há maneiras diferentes de se trair a esposa e o esposo. A mais conhecida é a infidelidade conjugal, em que ocorre o envolvimento afetivo e/ou sexual com uma terceira pessoa. Do ponto de vista espiritual, ela é uma maldade produzida pelo maligno que usa a pessoa. É uma escolha perversa. A pessoa traidora pode pensar que tem o autocontrole e pode se sentir poderosa na fantasia de que agora encontrou o “amor da minha vida”. Mas está sendo usada e talvez não tenha nenhuma noção disso. Usada para a destruição de sua dignidade, de seu autorrespeito, e usada para a destruição da confiança e da unidade afetiva e espiritual do casal. Você escolhe quem irá dirigir sua vida, o bem ou o mal.
Podemos trair pelo simples fato de não sermos a pessoa que nosso cônjuge queria que fôssemos. O que vai surgindo nos primeiros meses e anos de casamento na revelação do eu de cada um, marido e mulher, nem sempre coincide com a imagem ideal que cada um construiu do outro nos tempos de namoro e noivado. A solução para esse tipo de traição é perdoar o outro por ele/ela não ser aquele tipo de pessoa que você esperava. 
Como poderá funcionar um casamento sem a renúncia de ter o cônjuge igual nosso sonho esperava? O caminho a ser percorrido entre o sonho e a realidade é feito com dor, tristeza, angústia, ao enfrentar a decepção. O casal precisa conversar sobre isso. Claro que é uma conversa difícil, dolorosa, mas necessária. Ela em geral ocorre só após um longo tempo de problemas de comunicação, quando, então, um toma a iniciativa de expressar sua zanga pelo sofrimento causado por essa frustração, e também pela culpa de não se sentir capaz de atingir a expectativa do outro.
Dependendo do tipo de pessoa, a transição entre o ideal e o real é bem difícil porque a idealização do outro era uma forma de viver. Desidealizando, então, é como puxar o tapete da pessoa e ela fica sem chão. 
Quando no casamento a realidade é encarada, e cada um deixa a idealização de lado, realmente surge a percepção clara dos defeitos pessoais. E nesse sentido, não há nenhuma forma de qualquer casamento zerar isso, ou seja, eliminar as diferenças devido aos defeitos de cada um. Isso significa que a boa convivência exige a aceitação e o perdão pelos defeitos do outro, defeitos que serão provavelmente sempre sem conciliação.
Evidentemente que a desidealização, o perdão pelo outro não ser como sonhávamos, precisam ser praticados por ambos, porque não há casamentos em que o problema é de um só. Cada um tem que parar com a acusação tipo: “Você me faz infeliz!”, “Sofro porque você não me preenche!”, “Você é o(a) culpado(a) da minha frustração no casamento!”
A harmonia pode ocorrer se ambos (e todos os membros da família) assumirem sua participação nos conflitos em casa, e perceber e aceitar que o principal não é aquele ponto de atrito em si, mas o que ele representa no mundo emocional de cada um.
Um problema que parece insolúvel tem que ver com um(a) esposo(a) que sente que morreu o desejo salvar seu casamento. Aqui só milagre de Deus. Mas esse indivíduo vai precisar, pelo menos, exercer boa vontade para deixar Deus atuar em seu desejo e milagrosamente criar o que não existe: a vontade de recomeçar no mesmo casamento.
Jesus disse que o eu precisa morrer, o que é, à princípio, bem doloroso. É uma morte tão real quanto a física. Você entrega seu desejo de um ideal que não está errado em si, mas que não é possível nessa vida, do outro ser como você gostaria e nem de você ser como ele/ela gostaria que você fosse. É uma morte parcial de nós mesmos. Envolve a renúncia dos aspectos de um ego orgulhoso, egoísta, comodista. É um quebrantamento. Para haver em seguida uma ressurreição de alguém melhor, mais sereno(a), pé no chão, que até pode ser feliz.
Texto baseado em “O perdão no casamento”, Deonira L. Viganó La Rosa, terapeuta de casal, mestre em Psicologia, Livro da Família 2013, pág. 51 e 52, Editora Pe. Reus.

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César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

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