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O que os pais podem aprender com os problemas dos filhos - 18 de agosto 2011
Assistindo ao programa “Consultório de Família” na TV Novo Tempo, um dos entrevistados comentou que, como conselheiro espiritual, muitas pessoas o procuram pedindo ajuda para problemas com um filho ou filha. Estes pais e mães, angustiados com os distúrbios dos filhos, queriam que a comunidade religiosa que frequentam, e os líderes dela, resolvessem o problema. Resolvem?
Antes de trabalhar como psiquiatra, fui professor por dois anos. Não era raro pais pedirem ajuda para os filhos “problemáticos”. Acreditavam que a escola resolveria os problemas que eles, pais, não conseguiam com seus filhos. A escola consegue resolver?
O mesmo ocorre no trabalho de psicólogos e psiquiatras. Recebemos pedidos de ajuda vindo de pais e mães, para filho ou filha com transtornos comportamentais, seja dependência química, agressividade, desânimo escolar, hiperatividade, desatenção, falta de interesse na vida, vida totalmente desregrada, dormindo até tarde, sem estudar, sem trabalhar tendo idade para isto, superprotegidos, etc.
Será que professores, conselheiros espirituais, médicos, psicólogos, psiquiatras, podem resolver problemas de comportamento dos filhos das pessoas que, angustiados, nos procuram?
O pastor que estava no programa da TV falou, e estava certo, que quando um pai ou mãe trazem um problema de um filho ou filha para ele ajudar, crendo que ele terá a solução, o que falta, na verdade, é harmonia, bom entrosamento, e sabe-se lá o que, no núcleo da família.
É verdade que algumas crianças são mais difíceis que outras. E também é verdade que alguns pais e mães são também bem difíceis. São impacientes, nervosos, gritam com a criança com descontrole emocional, tiram o corpo fora da responsabilidade de cuidar dos filhos, jogando tudo sobre o pai ou sobre a mãe, agridem a criança com pancadas, não conversam com ela, não dão chance a ela de se expressar, e depois, quando esta criança apresenta problema de comportamento, querem que outra pessoa solucione o problema. É bem difícil.
Não estou culpando os pais pelos sofrimentos dos filhos. Mas é muito difícil uma criança já nascer com um monte de problemas, não é? Ela pode nascer com uma tendência para ser mais agitada, ou depressiva, ou questionadora, ou lenta, melancólica, mas estas coisas são apenas tendências. E estas tendências serão desenvolvidas em hábitos na dependência direta da maneira como os pais, ou quem educa a criança nos primeiros anos da infância, lidarão com ela.
Já escrevi aqui sobre uma das atitudes que facilita a crise de pânico num adulto que é a pessoa com pânico ter sido criada por uma mãe (pode ser o pai também) muito ansiosa, que não conseguia acalmar o bebê. Talvez este bebê, que mais tarde passou a ser uma pessoa com pânico, já tivesse nascido mais ansioso que a média (herdando isto dos pais, avós...). Mas se a mãe (e/ou pai) tivesse controlado sua própria ansiedade e cuidado da criança com serenidade, a tendência dela (da criança) de ser ansiosa teria talvez sido diminuída, o que ajudaria a prevenir a crise de pânico anos à frente. Não estou dizendo que quem tem crise de pânico teve obrigatoriamente uma mãe (e/ou pai) muito ansiosa. Há outros fatores envolvidos na crise do pânico.
É muito difícil consertar uma árvore, mesmo pequena, que foi cultivada torta. Aqui também a prevenção vale ouro. Mais vale uma grama de prevenção do que mil quilos de tratamento. Nós, professores, conselheiros espirituais, psicólogos, psiquiatras, não conseguiremos consertar as “tortuosidades” de um adulto que veio com problemas de relacionamento familiar e pessoal desde a infância. Poderemos acolher a pessoa e orientá-la num caminho saudável, mas é ela que dará os passos da recuperação. Remédios químicos também não tem este poder de mudar a pessoa. Mas pelo menos, se os pais conseguirem se conscientizar de que erraram, e fazerem algo hoje para consertar, do que depende deles, eles mesmos poderão obter serenidade. Muitos pais enviam seus filhos para estes profissionais os “consertarem” e tiram o corpo fora, permanecendo pessoas nervosas, sem autocontrole emocional, depressivas, agitadas, maldosas, autoritárias, agressivas verbalmente (e até fisicamente).
Será um desafio muito grande para os filhos terem o conserto dos machucados emocionais originados tanto nos erros dos pais (e de outras pessoas que participaram da sua criação), quanto devido à própria sensibilidade destes filhos, que facilitaram o surgimento dos sintomas atuais. De alguma forma e assim que possível, será importante estes filhos aprenderem que mais importante do que os pais deles fizeram com eles, é o que eles fazem com o que os pais fizeram. E se os pais deles derem uma olhada para a infância deles mesmos, poderão encontrar causas do por que falharam na educação emocional de seus filhos.
Então, antes de levar seu filho ou sua filha para alguém tratar e “dar um jeito”, pare, olhe a si mesmo, e veja o que precisa ser mudado em seu próprio comportamento para que você possa dar um bom exemplo de pessoa emocionalmente equilibrada. Senão fica, no mínimo, injusto.
Cesar Vasconcellos de Souza
Saúde Mental e Você
O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.
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