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O desafio de conhecer a nós mesmos
A frase ''conhece-te a ti mesmo e conhecerás o universo e os deuses'' estava inscrita na entrada do santuário de Delfos, na Grécia antiga, e atribui-se ter sido difundida pelo filósofo Sócrates. Conhece-te a ti mesmo. Difícil? Fácil? Atual? Necessário?
O texto bíblico, relatando a crucifixão de Jesus Cristo, menciona dois ladrões que foram crucificados, um ao lado direito e outro ao lado esquerdo de Cristo. Estes dois criminosos são popularmente chamados de “bom” e “mau” ladrão. Ambos haviam feito besteiras na vida, e na cruz pagavam o preço delas, numa execução tão cruel quanto a corrupção que domina a mente de gente possuída pelos demônios da ganância, com desprezo pelo povo, praticando atos de egocentrismo devido à visão materialista da existência.
O “bom ladrão” conseguiu aprender algo deste “conhece-te a ti mesmo”. Numa reportagem recente, um ex-governador do Estado do Rio, condenado há dezenas de anos de prisão, culpado de uma série de crimes, se disse aliviado ao admitir que realmente agia corruptamente desde o início de seu governo. Numa cena de aparente cinismo ele afirmou que após confessar sua culpa e parar de dar desculpas para seus crimes, se sentia melhor, aliviado. Admitir culpa verdadeira pode realmente aliviar.
O “bom ladrão” deve ter sentido alívio, em meio ao sofrimento intenso na cruz, ao admitir-se culpado. Repreendendo seu colega corrupto, disse: “Nem ao menos temes a Deus, estando em igual sentença? Nós, na verdade, com justiça, porque recebemos o castigo que os nossos atos merecem; mas Este nenhum mal fez.” E, olhando para Jesus, pediu a Ele: “Jesus, lembra-te de mim quando entrares no Teu reino.” E Jesus lhe respondeu o pedido dizendo: “Em verdade hoje te digo, estarás comigo no Paraíso.” (Evangelho do médico Dr. Lucas, capítulo 23, versículos 40 ao 43).
Já o “mau ladrão” proferia blasfêmias contra Cristo, cheio de revolta, revelava uma resistência à percepção de seus erros, igualzinho aos corruptos que se dizem inocentes mesmo diante de provas irrefutáveis de seus delitos. Acreditam na mentira. Vivem a mentira. São possuídos pelos demônios da mentira, assim não podem ter paz. Conseguem muito dinheiro. Nada mais. Por isso são pobres, porque a única coisa que sobra na vida deles são bens materiais adquiridos de maneira que deixa a população com prejuízos graves. Carecem de autoconhecimento de forma que produza benefícios para a humanidade. O “mau ladrão” não se conhecia também.
Nélida Piñon, membro da Academia Brasileira de Letras, comenta sobre a frase “conhece-te a ti mesmo”: “A sentença convence-nos de que o homem tem condições de visitar o templo da alma, de percorrer suas salas como se estivesse em um museu, assim podendo, no final desta inspeção, decifrar os próprios mistérios, o tumulto das suas emoções e os sentimentos que leva encarcerados no peito. Balbuciar as muitas línguas que cada qual fala no interior do seu coração. Enumerar os diversos seres que o habitam. Mencionar as maravilhas e os assombros que perturbam a imaginação humana. Esclarecer de qual combustão a paixão é feita, para que a vista lhe escureça de repente e as palavras tenham febre.
A frase sugere ainda que os deuses, astutos por excelência, admitem a malícia do homem, num recurso que, desde sempre a serviço de sua humanidade, ajuda-o a esquivar-se dos desastres, a fiscalizar a besta que dorme e desperta com ele.
Saídas da boca dos oráculos, as palavras ''conhece-te a ti mesmo'' esquecem, contudo, de equacionar o tempo que o homem necessita para expurgar seus demônios interiores. Não mencionam que lhe seja um dia possível vislumbrar, em um simples átimo, a existência de um muro moral que o isole dos perigos do mundo. Uma murada que o abrigue das intempéries engendradas pelo seu instinto predatório.” (http://www.academia.org.br/artigos/conhece-te-ti-mesmo).
Conhece-te a ti mesmo. Difícil? Fácil? Atual? Necessário? O que você acha?
Cesar Vasconcellos de Souza
Saúde Mental e Você
O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.
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