Internet e o desenvolvimento do seu cérebro

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Numa entrevista concedida pela Dra. Susan Greenfield à revista "Ser Médico”, do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, n.62, Jan-Mar 2013, a neurocientista professora de farmacologia sináptica na Universidade de Oxford e de fisiologia no Lincoln College, Inglaterra, mostra os perigos para a saúde quando há excesso de uso da internet.

Ela explica que crianças pequenas e adolescentes podem ser prejudicados no desenvolvimento mental pelo imediatismo das imagens na internet, porque acabam não tendo saudável evolução nas estruturas conceituais que ligam um fato ao outro. Diz ela: "É o oposto das histórias contadas pelos pais, que oferecem início, meio e fim, lógica que estimula o cérebro a pensar em sequência, associar a causa, o efeito e o significado.” (p.6)

Quando foi perguntado a Dra. Susan se as novas tecnologias como a internet e os jogos de computador tornam as crianças mais inteligentes, ela respondeu: "É preciso distinguir a ‘inteligência fluída’, relacionada à resolução de problemas novos, que não necessitam instruções aprendidas pela experiência e por fatores socioculturais, da inteligência cristalizada’, vinculada ao conhecimento adquirido no decorrer da vida. "Quando eu tinha 16 anos, adorava Shakespeare e fazia meu irmãozinho de três [anos] decorar falas de Macbeth. Ela aprendia rapidamente, entretanto, não era capaz de entender. Não estava ficando mais inteligente, apenas demonstrando sua capacidade de traçar um desenho mental nada cristalizado. Meu irmãozinho sabia de cor uma cena de Macbeth, na qual a finitude da vida era simbolizada pela luz de uma vela. Se alguém perguntasse o significado, diria: ‘Isso é uma vela. Ela apaga. É o meu aniversário?’. Isto é, informação não é conhecimento, que demanda introjetar e contextualizar um fato. A partir de estudos, temo que permanecer na internet exageradamente infantilize o cérebro, justamente pela exposição repetida a flashes e imagens luminosas, sem conteúdo nem estrutura. O risco é moldarmos uma geração de jovens incapazes de pensar por si próprios e ou apáticos com os demais.” (p.6).

Ela comenta que se uma criança fica algum tempo no computador, mas também vivencia outras coisas como brincar no quintal, subir em árvores, correr pela praia, ter contato afetivo com os outros com abraços e beijos, ter amigos reais com quem brinca, isto é totalmente diferente de uma criança que permanece horas e horas num aparelho eletrônico, de frente para uma máquina excessivamente sem estas outras práticas saudáveis. Não é saudável, afirma esta neurocientista, um adolescente (ou adulto) se sentir sozinho caso não esteja conectado na internet.

Mas por que as pessoas estão ficando viciadas em redes sociais, por exemplo? Dra. Susan diz: "Parece que perder dias nas redes sociais é menos estressante do que conversar ao vivo. Não precisam enfrentar entonações de voz, cheiros, contato físico, olhos nos olhos, se expor a brigas, etc. Ao fugirem de situações corriqueiras que exigem iniciativa e coragem, tendem a se desenvolver de maneira indevida sem se dar conta, pois o cérebro humano é bom em camuflar certas coisas. Se o ambiente for limitado a duas dimensões, visão e audição, por um período de dez horas diárias ou mais, o cérebro terá seu funcionamento modificado. Conexões podem ser perdidas e, com elas, a oportunidade de tornar-se uma pessoa normal.” (p.7).

A cientista faz uma conexão sim, entre jogos (videogames) e violência social, reconhecendo que, apesar de ser um assunto complexo, tem relação de uma coisa com a outra. "Por que jovens queimam lojas, quebram estruturas sem ter a intenção de ao menos roubar coisas? Matam sem razão de matar, sem qualquer significado político, ideológico ou social?” (p.7).

Ela cita dois trabalhos científicos sobre este assunto, um deles feito pelo cientista Fuchun Lin, da Academia Chinesa de Ciências (revista PLOS One, 2012), que conclui que "jovens que navegam demais nas redes apresentam mudanças cerebrais semelhantes àquelas verificadas em compulsivos por jogos de azar.” E outro estudo da cientista Daphne Bavalier, da Universiade de Rochester (EUA), (Neuron, 2010), "mostra a grande correlação entre exagero no computador e anormalidades cerebrais.” (p.8).


TAGS:
César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.