Depressão e justiça social

quinta-feira, 06 de setembro de 2012

Necessitamos de justiça. As famílias, a comunidade, o município, o estado e o país necessitam dela. Sem justiça não há ordem, respeito, igualdade, nem condições de vida digna. Sem ela a maldade impera seja disfarçada de democracia ou explícita numa ditadura. Sem justiça, a saúde mental da população é prejudicada pois tira a esperança da existência de uma sociedade equilibrada. A perda da esperança é um fator central no surgimento da depressão mental.

Dan Blazer, professor de psiquiatria da Universidade Duke, Carolina do Norte, EUA, diz que a sociedade caminha para a desesperança, fala do perigo de se medicalizar as emoções, que a violência social aumenta sem visão de melhora no futuro, etc.

Portanto, sem justiça vem a desesperança. Viver em desesperança gera, segundo Dean Ornish, cardiologista professor da Faculdade de Medicina da Universidade da Califórnia em São Francisco, o “cinismo social”. Rollo May, profundo pensador e ex-presidente da Associação de Psicologia de Nova Iorque, também descreveu este fenômeno. Cinismo social é o acostumar-se com desgraças da sociedade de maneira que você passa a brincar com elas, solta piadas em cima da dor, faz charges engraçadas com situações das corrupções no mundo dos poderes sociais. Acostuma-se com a dor social evitável. Perceberam que escrevi “evitável”?

Justiça é perdão quando pensamos na teologia dos escritos de Paulo aos Romanos, que diz que ao ser justificado pela fé, mediante a graça, somos perdoados e surge a paz e a esperança. Ou seja, a corrupção do caráter tem jeito para quem quer a cura. Mas quem não a quer, ou quer, mas fica só no desejo e não dá passos concretos para obtê-la, já está julgado, permanece injusto, culpado. O corrupto que tem a ousadia maligna de dizer “Graças a Deus conseguimos esta propina!” está pior do que aquele que dá graças ao diabo, originador de toda corrupção, por mais uma fraude cometida contra a população.

A maldade destrói a própria pessoa que a comete. O bem, a justiça verdadeira, destrói a maldade dos maus. “A malícia matará o ímpio” Salmo 34:21. Mas os corruptos talvez não entendem isto, estão cegos para isto, e vivem com uma atitude mental de cinismo (consciente ou inconsciente?) disfarçada tantas vezes e frequentemente de frases pré-fabricadas visando o aplauso popular e a manutenção do poder. Não faz nenhum sentido permanecerem com o poder. Mas permanecem e, pior, são reeleitos. O que isto diz de nós, povo? O que ensina?

Vamos ter melhores governos? Não creio. Estou contaminado com a desesperança social? Sim, porque sem mudança de caráter do indivíduo, nada muda no social que seja duradouro, de valor ético, sem conflito de interesses, com real benefício para as classes menos favorecidas. Pense: a corrupção melhorou nos últimos 20 anos em nosso país? Ou apenas ficou mais exposta? A sociedade está mais tranquila porque a violência diminuiu? Se pessoas de poderes sociais permitirem ser movidas pelo bem, tomarem atitudes mais firmes e houver decisões finais úteis que se tornem prática social real, volto a ter esperança de justiça social. Infelizmente creio que isto não ocorrerá. Não é por isso que vamos desistir de fazer o bem.

“Quando me interrogo por que sempre me empenhei por ser honesto e compreensivo para com os outros, e se possível sempre bondoso, e por que não desisti mesmo quando percebi que com isso a gente se prejudica, a gente passa a ser bigorna porque os outros são cruéis e não merecem confiança, na verdade não sei a resposta.” Neurologista James Putnam, da Universidade de Harvard, citado por Hans Küng em “Freud e a questão da religião”, p.100, Verus Editora, 2005.

Uma coisa é certa, os que têm assumido papéis de poder social terão que prestar contas um dia de seus atos. A impunidade não existe para sempre. Por isso, não perca a esperança. Senão você pode ficar deprimido.

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César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

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