Gratidão gera gratidão

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Caminhamos anos à fio tecendo emendas de sabedoria. Ou melhor, buscando. Dizem que o avançar da idade tem isso de bom, a experiência um tanto convolada em saber. Mas devemos convir que algumas situações têm o condão de ensinar de forma intensa. O sofrimento, a despedida, a demissão, a separação, a perda etc, etc, etc. Creio que momentos que demandam alto grau de superação assemelham-se aos cursos intensivos, daqueles cujo principal desafio é aprender muitas coisas em pouco tempo. Funciona. Não sei quanto aos cursos, mas quanto à vida, invariavelmente há de surtir efeitos.

O existir por si só requer além de uma coragem intrínseca, algum nível de sabedoria. Quando só existe dificuldade, parece que a vida trabalha para preparar um novo momento. E ele chega. Ora, se tratarmos essa realidade como uma verdade, cientes de que coisas boas sempre estão por vir, de uma forma ou de outra, por que não sermos gratos desde então? Sem esperar o dia de amanhã. Pode ser tarde demais.

A gratidão é um sentimento que nos liga à força divina, ao supremo, ao universo, àquilo que transcende à visão humana e, para aqueles que creem nessa força resguardo a titulação respectiva. Penso que exalar esse sentimento nos resguarda de um monte de maus acontecimentos. Como se o imponderável carecesse desse voto de confiança. Como se o presságio das boas novas estivesse umbilicalmente ligado ao ato de sermos gratos a tudo e a todos, em qualquer circunstância.

Certa vez um senhor que atravessava sérios problemas com, em uma daquelas conversas em que muito ouvimos e pouco falamos, contando suas experiências de vida (e de fé) explicou-me a sua fórmula da longevidade com qualidade de vida.  E desde então esforço-me para seguir treinando o seu exemplo. O primeiro “obrigado” é proferido pela manhã, ao acordar. Estar vivo já é uma dádiva que merece ser contemplada durante todo o dia. Ao abrir os olhos e perceber a possibilidade de enxergar a luz do sol, o segundo “obrigado” do dia. Ao pisar, perceber que pode se locomover, que seus órgãos funcionam, mais muitos gestos de gratidão são proferidos. E por assim dizer – e viver – sua história simples pôde conquistar o patamar de exemplo. Pelo menos para mim.

Ser resiliente e grato é perceber que os pés doem, mas que podemos andar. Que a coluna não está lá “grande coisa”, mas que sustenta com maestria esse corpo que nos reveste. Que o dia de hoje pode não ser perfeito, mas que é o presente concebido e não pode ser desperdiçado. Que os sonhos não foram realizados da forma como queríamos, mas que temos força para batalhar. E por aí vai.

Sentir gratidão nesse nível é uma questão também de treinamento. Gratidão gera gratidão. A corrente ganha força e a energia do contentamento, da aceitação, da felicidade se expandem. Coisa chata é essa atmosfera de reclamações por todos os cantos, o dia inteiro. Se chove, está ruim. Se faz calor, piora. Se tem emprego, reclama. Se o perde, piora. Coisas assim. Como mensurar a dimensão da força que pode alcançar essa energia massiva de milhares de pessoas reclamando de tudo o tempo todo?

Que bom seria se o mesmo empenho em lamuriar fosse empregado em agradecer em qualquer conjuntura. Não quero caminhar com esforço ao longo de uma vida inteira e lá na frente perceber que o passado foi o melhor presente que me fora dado, aquele clássico sentimento de que “era feliz e não sabia”. Não quero perder minha vida para a ingratidão. Ser grato é questão de escolha. Uma ótima escolha. A começar por agora.

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Paula Farsoun

Com a palavra...

Paula é uma jovem friburguense, advogada, escritora e apaixonada desde sempre pela arte de escrever e o mundo dos livros. Ama família, flores e café e tem um olhar otimista voltado para o ser humano e suas relações, prerrogativas e experiências.

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