Colunas
A gota de orvalho
O escritor busca inspiração em tudo o que vê. Outono, na montanha, previsão de grandes estímulos para quem é atento aos elementos da natureza. Hoje, por sorte, uma gota de água pairou sobre uma folhinha de manjericão da minha horta na varanda. Foi o suficiente para lembrar-me de um trecho da canção “A felicidade”, de Toquinho e Vinicius de Moraes, que gosto muito: “A felicidade é como uma gota de orvalho numa pétala de flor... brilha tranquila, depois de leve oscila e cai como uma lágrima de amor.”
Ainda não consigo dissociar uma experiência da vida com um feito da mãe natureza. Permaneci alguns minutos observando a gota sobre a folha e um detalhe além da beleza me intrigava: a gota parecia ser enorme em proporção ao tamanho da folha de manjericão, bem pequena, daquelas que ficam no cume da planta. Era uma gotinha, mas era muita água para a superfície suspensa da folha miúda, concretizando um equilíbrio difícil de compreender. Eu não entendi porque a gota não escorreu pelo caule da planta. Supus o malabarismo de força que deveria estar sustentando aquele peso aparente. Era para ela estar naquele local, foi ali que encontrou morada, ou uma missão a cumprir, ou a proporção era perfeita, ou nada disso, estava por estar.
E então eu me pus, naturalmente, a refletir. A felicidade e a gota de orvalho. Tudo a ver. Quando quer ficar, fica. Quando é para ser, é. O que tem que ser, realmente tem muita força. E quanto ao peso? É muito relativo. Peso para quem? Se houver estrutura, fica leve. Se houver acolhimento, facilita. E com um tanto de sorte e a obra do destino, se desenrola.
A gota do orvalho, pode passar absolutamente despercebida. Pode ser subestimada diante de sua simplicidade. Pode ser efêmera. Pode requerer sustentação, preparo. Talvez até sorte, aquela coisa de estar no lugar certo, na hora certa. Assim como a felicidade. Quanta gente só percebe que era feliz e não sabia o dia em que deixa de ser? Quanta gente é feliz mas não tem tempo de perceber ? De tão simples que pode ser, nem nota, nem acredita, nem valoriza.
Como no trecho de Vinicius de Moraes, um dia, aquela gota que brilha, oscila e cai, em forma de lágrima. Tomara que seja de amor.
Pensamento da Semana :
Da felicidade
Quantas vezes a gente, em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura
Tendo-os na ponta do nariz!
(Mário Quintana)
Paula Farsoun
Com a palavra...
Paula é uma jovem friburguense, advogada, escritora e apaixonada desde sempre pela arte de escrever e o mundo dos livros. Ama família, flores e café e tem um olhar otimista voltado para o ser humano e suas relações, prerrogativas e experiências.
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