Brinde

sábado, 07 de dezembro de 2019

O brinde é um dos mais sublimes gestos do compartilhar a vida. Brindamos com quem temos afeição. Ninguém brinda com o inimigo. Brindamos para celebrar encontros, vitórias e até despedidas. Brindamos o que vivemos e brindamos ao que está por vir. O brinde tem a energia das boas explosões. Gera bons sentimentos sempre. Brinde é fé na vida e confiança nas pessoas.

Sobre o surgimento do brinde, tem uma lenda que cita o costume de grandes reis ao selar acordos. Assim, ambos batiam forte um na taça do outro para que o líquido de uma caísse no recipiente do outro. Caso uma delas contivesse veneno, ambos morreriam. A tradição de brindar se perpetuou mais do que o próprio verbo que o originou: confiar.

Brindar é reconhecer a arte do encontro. Brindar é perceber que estamos aqui para compartilhar o tempo e fazer do tempo algo mais agradável. Essa percepção nem sempre acaba evidente em meio ao papo sobre futebol, família, religião, política. 

Mas está ali, mesmo na euforia da grande festa ou nessa festa que se faz no cotidiano ligeiro que atropela momentos tão especiais. Brindar é, portanto, partilhar esse mundo por vezes cruel, mas também mágico e fascinante, porque as pessoas são mágicas e fascinantes.

Um amigo meu diria: “O Brasil me obriga a beber”. E se brinda, mesmo na constatação da pátria que vem desnudando a real face brasileira. E há tantas outras que não se tem obrigação de brindar, porque a obrigação é não ter obrigação. É espontâneo, belo, poético, livre.

Tão popular é o brinde ao bebê que nasce e dizemos que estamos bebendo o mijo do recém-chegado. Há quem brinde, ainda que com imensa tristeza, aquele que se foi ao ponto de não sabermos se a tristeza é por ter ficado ou por ter que ver o outro partir. Porque o brinde é também reconhecimento, uma forma bacana de dizer “eu te amo”, “você é importante”. Basta encher o copo, olhar nos olhos do outro e brindar. No fundo, a gente sabe. O brinde é consagração.

Muitos brindes e complementos na conjugação do verbo brindar. Brindes a cada conquista, ao meu encontro com você e com todos os demais. Brindes a cada minuto aqui, os vividos e os que almejamos viver. Brindes a saborear com os olhos, tanto quanto o paladar. 

Brindes a soar como anjos no tocar das taças e fé no silêncio dos olhos que traduzem o que as palavras não expressam. Brinde nesse tato do abraço para fazer do brinde sentimento e sentido em se sentir parte de algo maior.        

E ao que brindaremos nos próximos parágrafos da vida?

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Palavreando

Aos sábados, no Caderno Z, o jornalista Wanderson Nogueira explora a sua verve literária na coluna "Palavreando", onde fala de sentimentos e analisa o espírito e o comportamento humano.

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