Resposta do vento

sábado, 30 de janeiro de 2016

Eu poderia te responder com Alice: "pra quem não sabe onde quer chegar, qualquer caminho serve". Mas não sou qualquer caminho. Talvez, você nem queira ou precise de uma resposta ou respostas múltiplas. Você pode não querer resposta alguma. Sequer pretextos de ausência de resposta. Guardo para mim a resposta e também a falta dela. É apenas inspiração.  Sou o vento, o sol, a chuva e tudo que se transforma em tempestade.

Trago o vento que move, o sol que arde, a chuva que lava, o temporal que anuncia o reinício do ciclo. Por desatenção, não percebe. Por não ver, não sente. Por não querer, não acredita. Viaja. Fotografa e canta com outro. Cativa. Eu, sopro que move o destino, confabulo com a desistência de quem cansou de cavar para ver a sua raiz. Após intenso diálogo, descubro que é a minha intensidade que me impede de desistir, é a minha liberdade que me leva a insistir.

Queria tanto acalmar o meu/o seu ritmo. Livre, clamei por encontrar seus pés, sua âncora, sua rosa dos ventos. Não fui chão, nem mar, nem ar ao ser tudo e nada. Meio termo? Nego veementemente ser morno. Seu mapa, nem Colombo ou astronauta de mármore descobririam. Suas cores? Dali não concebeu. Eu? Atrevido, inventei algo próximo, possivelmente mais belo, forte - além do tom. Eu saio do tom.

Descubro da pior maneira que a minha música não era para mim e o poema também não. Sem perceber, traz mágoa ao meu peito cantando ao som de um violão desafinado, mas açucarado pela fruta azeda que escolheu. Respeito. Mas o sulco daquela boca que te delicia é o veneno que me suicida. 

Movimento sem mover uma palha de seu desconfiado coração. Decido não mais querer-te mesmo sabendo que quero. O vento se diverte com o acaso e tenta se desvencilhar dessa prisão. Liberto, dança com as flores do verão. Discreto, canto com os belos horizontes que se abrem ou com o limiar de um recife que do futuro construído com o passado flerta com a alegria de um agora que contagia. Por que não me rendo definitivamente a essas possibilidades? Deveria. Sua sombra não refresca. Sua ausência não acaricia.

Não quero mais casos. Não quero mais arrependimentos após o gozo flagelado. Quero, como bem diz, acalmar, aportar, mover o que quer ser movido para além da minha poética e ilusória percepção. Ir além desses carnavais que se findam em fevereiro. Vencer as barreiras que se paralisam em noite infrutífera. Quero dividir a minha vida e mergulhar nos rios que querem ser mergulhados.

Cansei de ser cozinhado nessa espera angustiante. Você vai em cruzeiro. Sou da constelação vizinha à Ursa Maior. Não iremos juntos a lugar algum. Minha vocação para ser plateia se aniquila ao inventar fazer no palco uma limonada. Não espere que eu beba ou aguarde que você engula até a última gota. Mereço mais. Posso te aplaudir por outras artes, mas não espere por flores minhas com cartão no camarim de seus devaneios. Seus ardores podem me causar dor. Algo de bom deve estar no virar da esquina.  

Diz que sou feito o vento. O mesmo vento que estipula a cadência do mar, mas não detém a direção do seu amar. Vento que não descobre suas raízes e é deliberadamente proibido de compartilhar de seu fruto. Vento que é acusado de julgar, mas que foi condenado desde o início a ser condução. A se desdobrar a dar o rumo dessa relação de vento, folhas, moinho, cata-vento, raízes, âncora. Contradição.  

Eu te amei com a força das tempestades, te adoro com a determinação dos furacões. Por adorar é que peço para deixar de ser vento e quem sabe ser apenas sol. Vigia de minha própria intensidade na busca por mais disciplina. Para que as paredes do meu coração sejam pichadas por outra razão. Resgate de meu afeto por outras direções. É chegada a hora de dar chance a outras possibilidades para me conceder novo coração.

Que eu consiga morrer de amor vivendo. 

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Wanderson Nogueira

Wanderson Nogueira

Observatório

Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e agora é deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna diária.

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