Observatório - 03/05/2014

sábado, 03 de maio de 2014
Foto de capa

Hoje é dia de crônica

 

Paixão de amigo

Todas as minhas amizades nasceram da paixão. Todas elas são produtos da paixão que nutri. E eu me apaixonei por todos os meus amigos, não só uma, nem duas, mas infinitas vezes. Apaixonei-me por eles até me desapaixonar para me apaixonar de novo. E não menti, não traí, apenas me entreguei... De alma e coração, me entreguei sem compromisso, assumindo toda a responsabilidade do mundo em fazê-los felizes e, por fazê-los felizes, me fazer feliz.  

E se apaixonar é tão bom, ainda mais quando existe a possibilidade de estar apaixonado por mais de um, ainda que poucos. E isso só é possível na paixão de amigo. 

Por mais que a paixão não nos deixe ver certas coisas com clareza, vi também defeitos e imperfeições. Foi aí que fechei os olhos, mas quando abri, incomodado por certos defeitos, não titubeei em conversar sobre esses defeitos, reconhecendo-os sem ousar em corrigi-los, apenas aceitei ao ponto de descobrir que certas imperfeições eram perfeitas para mim. Isso faz parte da confiança. Fiel, me desbravei pelo destino, desvencilhando-me dos contratempos, cuidando e eternizando diariamente de cada amizade.  

Alguns amigos eu conquistei, os escolhi no meio da multidão para compartilharem comigo esse mundo de aventuras e desventuras. Começou com um olhar, observação, uma admiração evoluindo para paixão. Lutei, briguei e esperei para tê-los ao meu lado. Nem todos vieram ao chamado — e não por acaso. Há grupos que não se formam, há pessoas que não valem a pena, há ilusões doces que salgam a alma e se comprovam naturalmente como dispensáveis. Sou grato por isso, pois anteciparam as decepções exageradas que poderiam vir a surgir. Mas todos aqueles que eu conquistei, poucos e bons, me apaixono e desapaixono até me apaixonar de novo no minuto seguinte, num ciclo vicioso que me prende livremente a eles, tornando-os fundamentais, essenciais, indispensáveis a minha sobrevivência. Uma amizade verdadeira é assim, ainda que amizade verdadeira seja pleonasmo e para fugir do erro gramatical e dizer o que realmente é, confidencio que todas as minhas amizades são fruto da paixão, paixão de amigo: a mais confiável, plena e duradoura paixão.  

Outros amigos me conquistaram. Talvez, tenham me escolhido no meio da multidão a fim de construir algo bonito e fascinante num mundo de inesgotáveis possibilidades. Começou com um interesse em sorrir, festejar, voar, trocar experiências ao ponto de fazer dessa troca algo imprescindível na vida, evoluindo naturalmente para a paixão que nada contém e tudo transforma. Admito que me diverti com todos eles e foi ótimo o tempo em que estive com cada um deles, o que torna passível de repetições. Mas amizade é mais que festa, muito mais que aventuras, loucuras e zoadas. Amizade é festa, aventura, loucura e zoadas, mas é também descoberta, ombro, conversa séria e piada. É estar junto, sem necessariamente estar perto, é sentimento, é crescer junto, é escolher. É se dar sem querer receber e, ainda assim, receber desinteressadamente bastante. É desobrigadamente preocupação e cuidados constantes. Por tudo isso, por alguns me deixei ser escolhido e, escolhido, não deixei de me apaixonar também.   

Assim, por todos eles, esses poucos e bons, me apaixonei ao ponto de amá-los sem dor, com perdões e desculpas por não poder estar com eles em todos os lugares e ficar com eles em todos os instantes, ainda que a paixão de amigo faça com que eu sonhe num paraíso em que todos eles estão lá o tempo todo comigo, compartilhando essa felicidade plena em reconhecê-los, os poucos e bons, que fazem toda a diferença e aumentam ou diminuem a minha felicidade. Cuidando deles e me deixando ser cuidado por eles, ao ponto de ambos cuidarem da paixão que alimenta a amizade transformando-a sempre em algo maior e melhor, adicionando novas histórias às velhas histórias que contaremos sempre com doses de orgulho, nostalgia, sorrisos e lágrimas.          

E tenho coração suficiente para viver me apaixonando por eles, por esses poucos e bons que me dão satisfação em viver a vida. E tenho alma o bastante para me apaixonar por eles eternamente, nessa e em outras vidas, quantas puderem existir, quantas vierem a me agraciar. Se não os encontrar, eles me encontram. Se não for encontrado, eu os procuro. Até achá-los no meio da multidão para me apaixonar e desapaixonar, até me apaixonar de novo ao ponto que a amizade se torne apaixonante como deve ser.

Foto da galeria
TAGS:
Wanderson Nogueira

Wanderson Nogueira

Observatório

Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e agora é deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna diária.

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.