Colunas
Lua, estrelas, borboleta, nós e o tempo
Fazia tempo que eu não olhava para a lua, nem para as estrelas. A lua e as estrelas continuaram olhando para mim esse tempo todo que eu não olhava para elas. Hoje, voltei a olhar para a lua e para as estrelas. Vi até um rabisco de luz cortar o céu. Foi um aceno. Talvez um olá ou um seja bem-vindo. Bem-vindo de volta!
Eu posso deixar a música tocar e não a ouvir. Mas que sentido tem deixar a música tocar e não a ouvir? Sei que o tempo é ligeiro. Sei que não quero ir embora cedo. Sei que a desistência permanece à espreita na porta do meu quarto todos os dias quando levanto e volta quando vou dormir. Não descansa, nem no meu sossego. Mas teimoso, sigo. Insistente, sonho. Porque o amor e a espera pelo amor sustentam minha gravidade. Devoram meu equilíbrio para se permitir a emoção que não se prevê. Emoção que se prevê não é emoção.
A ilusão de ser lua ou estrela é combatida quando as aprecio daqui. Estou para a lua e as estrelas, como a lua e as estrelas estão para mim. Elas estão no lugar delas - suspensas onde devem estar. Eu estou no lugar certo - caminhando pela terra e pelos caminhos que escolhi para mim. Algumas vezes, abismos se colocam na minha frente. Tantas outras, eu crio abismos para mim. Paro ou caio. Caio ou voo.
Todos os dias escolho o que quero e muitas coisas que me querem me escolhem também. Sem se apresentar. De forma abusada, mas respeitosa. Se as convido? Não sei. Tenho sempre o direito da escolha? Ousadia. Viver é uma ousadia.
Dia desses, ela entrou pela janela e passeou pela minha sala. Leve, livre, bela. Suas poucas cores, talvez duas, três ou quatro chamavam mais a atenção do que as múltiplas cores da televisão. Assim como observo a lua e as estrelas, fiquei vendo a sua viagem por aqueles poucos metros quadrados, muito menores do que toda a imensidão lá de fora. Mas ali, ela era a dama mais imponente e importante. Deslizou pela cortina, se guiou pelas luzes do lustre. Dançava valsa ou a mistura de muitas danças? Fez parte da cena pintada no quadro. Teve dificuldades para se encontrar nas paredes. Até que repousou na parede chapiscada e lá ficou. Serena.
Tirei fotos. Guardei na memória. Linda! Fiquei a vendo por alguns segundos, talvez minutos. Num piscar de olhos, entre um sopro e outro, ela não estava mais lá. Pensei: ela foi embora e nem percebi. Pouco depois, a vi, caída no chão. Paralisada, sem vida. Suas cores continuavam vívidas. Suas asas, no entanto, já não mais batiam. Seu voo cessou. A borboleta me ensinou...
É tão perene o tempo no compasso que nos cessa, sem que ele se cesse. Não estaciona por um instante para que recoloquemos nossas asas, não dá intervalos para que consertemos o coração ou recobremos nossa alma.
Fazê-lo de aliado é uma arte, pois aprendemos na experiência perigosa de quem não pode errar. Não há segundas chances. Apenas acúmulo de vivência para viver melhor. Será que as borboletas admiram a lua e as estrelas?
Wanderson Nogueira
Observatório
Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e agora é deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna diária.
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