Essa tal felicidade

sábado, 28 de julho de 2018

Pelos próximos meses, a jornalista Laiane Tavares assina a coluna no lugar do titular Wanderson Nogueira. A Justiça Eleitoral determina que candidatos nas Eleições 2018 não podem apresentar, participar ou dar nome a programas de rádio e TV. A regra não se aplica aos órgãos impressos. Mesmo assim, o colunista e A VOZ DA SERRA, em comum acordo, optaram pela alteração neste período. Wanderson Nogueira volta a assinar o Observatório em outubro, após o período eleitoral.

“Ninguém consegue ser feliz o dia todo, mas todo mundo pode ser feliz todo dia”. Todas as vezes que o assunto é essa tal felicidade, me lembro dessas palavras ditas por um amigo querido há alguns anos. Naquele dia nós não falávamos sobre a vida, falávamos de trabalho. A felicidade era nossa pauta. Logo depois dessa troca de ideias eu saí para entrevistar algumas pessoas aleatoriamente, sempre perguntado duas coisas. A primeira pergunta era a mais direta “você é feliz?” a segunda mais reflexiva “o que é felicidade para você?”.

No vídeo ninguém quer parecer infeliz, pouco feliz ou indiferente a felicidade, então para a primeira pergunta a resposta sempre era “sou”. “Sim, eu sou feliz” - me disseram todos naquele dia. No meu íntimo eu pensava que ou o meu amigo estava errado ou uma grande coincidência que envolvia todas as pessoas estarem felizes às três da tarde estava acontecendo, ou talvez as pessoas encarassem aquela pergunta como quem encara uma prova e quisessem dar a resposta correta. O que elas não esperavam era o “justifique sua resposta” da pergunta seguinte.

Quando questionadas sobre ‘o que era a felicidade’, todas aquelas pessoas que se diziam felizes ficavam confusas. A maioria dizia que era ter saúde, algumas diziam que estavam com pressa e saíam andando, me deixavam só com aquele “sim, eu sou feliz”. Ao longo do dia aquelas pessoas foram me entristecendo. Eu estava feliz antes, tenho certeza. Todo jornalista sabe que a pauta sempre está viva e, por isso, pode correr. A minha pauta estava correndo de mim nas ruas, dizendo coisas que não combinavam com a construção da minha matéria. Eu ainda era inexperiente na profissão, mas cresci bastante naquela tarde.

Não tinha jeito, eu precisava do material. Quando a gente vai para a rua em busca dele, não é como se pudéssemos voltar e avisar na redação “olha, as pessoas não colaboraram não”. Então eu mudei a minha segunda pergunta para “o que te faz feliz?”. Ninguém me disse saúde. Era o fim dos espirros.

As respostas eram sempre muito particulares: “abraçar os meus filhos”, “pagar minhas contas”, “estar com quem eu amo”, “bolo de chocolate com cenoura”, “dias de sol”, “meus amigos”, “ir visitar minha mãe”, “férias”, “estar com Deus”. Essas segundas respostas da minha segunda tentativa, eram felizes. As pessoas sorriam ao falar, lembravam, davam detalhes e seguiam seus caminhos mais animadas do que quando chegaram me dizendo “sim, eu sou feliz”.

Já era por volta das quatro da tarde quando coincidentemente todas as pessoas estavam felizes, de verdade. Aconteceu, bem ali na minha frente. É claro que desde o início a frase do meu amigo fez muito sentido, mas frases por si só não sustentam uma explicação, assim como perguntas diretas não dão conta de abarcar todo o entorno de uma emoção.

Eu tenho certeza que ninguém que passou por mim aquele dia foi feliz o dia todo, mas só de lembrar que são felizes em algum momento, elas foram felizes de novo. E a felicidade é um pouco contagiante, sabe? Enquanto elas falavam daquelas coisas tão incríveis como um bolo de cenoura com chocolate eu mesma ia lembrando como isso é bom, e como também me faz feliz.

Quando eu pensei em escrever sobre felicidade no início desse texto, o objetivo era outro, eu ia falar das músicas, das poesias, dos filmes e das pesquisas científicas sobre o tema, mas fui lembrando desse dia e todo resto me pareceu tão chato. Então eu apaguei algumas linhas e recomecei porque eu não quero ter de preencher nenhum espaço da minha vida com a resposta correta ou com o texto mais embasado. Eu não quero dizer “Sim, eu sou feliz” para alguém nas ruas como se eu precisasse de uma resposta certa, ou de todas as respostas.

Eu não sou obrigada a nada, nem a ser feliz. Mas que bom que assim como aquelas pessoas, eu tenho os meus cachorros, as pessoas que eu amo, os dias de sol, o amigo da frase lá de cima, férias e bolo de bolo, porque eu sempre escolho bolo de bolo a qualquer bolo. Viu, a felicidade é mais ou menos isso aí que acontece uma vez ao dia, no meio da tarde. Às vezes você precisa mudar as perguntas para reconhecê-la, às vezes é só tirar o chocolate, a cenoura e optar por um bolo comum. Vai fazendo do seu jeito, é para ser feliz, não é para viver feliz. 

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Wanderson Nogueira

Observatório

Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e agora é deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna diária.

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