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Dois eu você e só
Eu te vi. Inesperadamente, eu te vi. Sem pensar em você, surgiu você do nada. Eu que achava que não mais te queria, de repente, diante do desafio de te encarar, me vi querendo você. Como sempre quis. Como nunca mais jurei querer. Te quis. Minha boca que recusou a sua quis a tua. Meu peito fechado quis se abrir. Meu sono, que de velado, se desfez.
Tudo porque eu te vi. E te quis. Quisera não querer. Quisera não ter esse sentimento que nem sabia mais persistir. Mas existiu de novo toda a vontade, desejo e necessidade. Por quê? Eu quis não querer, mas eu quis.
Minhas pernas trêmulas. Minha face transformada. Minha alma transtornada. Meu eu de certezas perdido nas incertezas de quem disse não te querer, porém no fundo e agora dizem te querer. Perder. Ganhar. Perder para ganhar, sem querer ganhar para não perder.
Por que me abraça assim? Com essa pele quente que nem lembrava. Ironiza. "Faz tanto tempo". Sua pele se tatuando na minha. Eu cedo sabendo que não poderia (deveria) ceder. Sede. Brincadeira essa com as palavras - faço eu.
Você? Ouse apenas ser você. Brinca de mocinho e bandido. Vilania ingênua que aceito na fé de que os heróis sempre vencem no final. Quando será o final? Só quero que o meio seja menos sofrido, com menos espera, com mais presença, com todo o amor.
Aqui, no nada, rio. Como sua presença mexe comigo - confesso. Seu abraço então denuncia que as janelas da minha existência estilhaçam pela natural força do seu olhar. Tem cor de céu - já disse. Volto a dizer. Essa proximidade destrói minhas defesas e constrói um mundo. Talvez planeta, planetas com luas, sóis e satélites. Eu sol, você lua ou você sol e eu lua. Satélites só observam, torcem. Quem não torceria para que essa união desse certo?
Invento entrelinhas para você não entender. Escondo a verdade e encontro proteção na licença poética. Como se poesia absolvesse... Música condena. À perdição. Perdição de quem se encontra nos braços de quem lhe tira o ar, a respiração, a independência. Admito - dependo da sua existência para a minha persistir. Exagerado, como o romantismo é.
Não errei de ano ou século. A paixão é que fugiu da atualidade. Recuso ser atual. Sou um romântico incorrigível. Desses que beiram a loucura entregue. Do tipo que prefere se machucar sendo intenso ao morto vivo que não sabe o que é um arranhão. Quem é aquele de boné azul na sua foto? Vasculho. Te odeio. Venha com desculpas esfarrapadas que ajeito o aceite sem aceitar. Também sei ironizar.
Falo de mim olhando para você. Dentro de mim você acaba sendo falante demais. Reflito acerca de todos os reflexos que me causa. Causa. Ah! Tanto silêncio para tantas linhas a se completar. Não é o sorriso, ainda que seja também. Não é o mistério, ainda que seja também. Não é o beijo, ainda que seja também. É o olhar, o sarcasmo e o abraço. É esse todo de intenção e de recusa. É o passado perdido, o presente pedido e o futuro insinuado. São tantas coisas misturadas nos dois um só. Dois eu você e só. É isso?
Diz que lê o que escrevo. Acompanha o que digo e os sonhos que publicizo. Uma dica: leia as entrelinhas... Uma confissão: essa também é para você!
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Wanderson Nogueira
Observatório
Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e agora é deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna diária.
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