Colunas
Bom dia, Nova Friburgo
Entre as montanhas, no meio do vale, minha cidade acorda com preguiça. Pouco a pouco o sol vai irrompendo os morros, e, invadindo as casas, convida todos a acordar, a sair... Do lado de fora não há como ver o mar, minha cidade não tem mar, mas tem o azul mais lindo que qualquer outro lugar.
O canto dos pássaros se confunde com o vento suave que acaricia suas árvores. São rouxinóis, canarinhos, trinca-ferros nas palmeiras, cerejeiras, ipês... Do alto de seus picos se vê o mundo. Lá de baixo é possível banhar-se em suas cachoeiras que jorram águas que mansas deslizam, que atrevidas desviam das pedras, que formosas levam as lágrimas de quem chorou à noite sob suas pontes que cruzam caminhos.
A natureza brinda homens e mulheres à labuta diária. Bom dia! Bom dia Nova Friburgo! E os sons da natureza vão sendo sobrepostos pelos passos de quem perdeu a hora ou de quem tem hora para chegar. As correntes das bicicletas giram velozes como as máquinas de costuras que cosem sonhos. O trânsito tira a paciência, mas possibilita observar melhor as margens coloridas de nossas vias. As pás, enxadas e britadeiras consertam o que a chuva levou. A poeira baixa. A lama seca. A água lava... O que se despedaçou conserta. O que se perdeu se recupera. Quem se foi não se esquece... Lembranças.
O dia, como o ano começa com lembranças e é próprio do tempo lembrar e contar as histórias que escrevem a biografia de um povo. São histórias bonitas e tristes que se entremeiam às histórias de quem sobreviveu para contá-las e recomeçá-las para que outros possam contá-las e recomeçá-las também num ciclo sem fim. A vida segue sempre.
A saudade, o ciúme e o amor permanecem lá no Suspiro e se espalham por todos os lugares, arrastando-se para dentro dos prédios antigos e os modernos também. Emergindo por entre as praças, todas as praças, ruas e avenidas, invade o coração de todos, meninos e meninas, jovens e adultos, velhos e velhas que se saúdam com o regozijo de terem saudade, de sentirem ciúme, de ainda buscarem o amor.
Trocam as flores que aqui nascem mais belas e mais pomposas nessas terras para dizer que sonham ainda que seus sonhos estejam depositados numa estrela distante que cintila no céu. Orgulhosos recomeçam, porque aprenderam a ser teimosos como a vida que insiste em prosseguir. O dia vai, o bom dia vira boa tarde e se encerra no boa noite para ser bom dia outra vez. Mãos e pés cansados descansam nos segredos noturnos que toda cidade tem. Acolhidos pela fé, pela música, pelo silêncio, conseguem ver aquela estrela distante no meio do nada que brilha mais do que as outras para ser observada. Sonhos são verdades que podem se realizar.
Os escolhidos para ser deste lugar, mesmo aqueles que não estão mais aqui, entre nós, dizem estar tudo bem, que vai ficar tudo bem, que não lamentam, mas agradecem pelo privilégio de fazer parte de uma história que como toda história se faz de início, meio e fim... Recomeço.
Tudo ficará bem, melhor do que ontem porque esses aprenderam a se superar, foram designados a querer mais e por querer mais possuem também a capacidade em dar ao presente a intenção de um futuro ainda melhor.
Entre as montanhas, no meio do vale, minha cidade dorme com gana de renascer e de se reinventar. Pouco a pouco, a noite cai, o frio desce e a brisa escapa pelas portas e janelas entreabertas convidando todos a sonhar. O sonho garante que Nova Friburgo é uma cidade que cresce pro céu. Do lado de fora não há como ver, ouvir ou sentir o mar, minha cidade não tem mar, mas tem o luar mais lindo que qualquer outro lugar.
Wanderson Nogueira
Observatório
Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e agora é deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna diária.
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