Colunas
Quando as pedras do rio brilham sob as águas
Foram muitas as conversas que tivemos no 1º Encontro Fluminense de
Escritores. Entretanto, uma me chamou a atenção, a que faz as pedras de um
rio brilharem sob as águas.
Tenho tido pouco tempo para ler. O que é ruim. Essa modernidade toda
em que estamos mergulhados, que nos faz viver em dois mundos, o real e o
virtual, nos rouba o tempo para ler. Tenho lido, enquanto pesquisa para
escrever esta coluna semanal. Porém, o tempo ficou raro para ler histórias,
degustar as palavras, as ideias e os valores contidos no texto, o modo que o
autor tem para a criar. Quando acontece de existir no meu dia, já é tarde da
noite; estou pestanejando e caio no sono. Pronto!, o dia amanhece e tudo
recomeça.
Bem, estava lendo o livro de Mia Couto, UM RIO CHAMADO TEMPO,
UMA CASA CHAMADA TERRA, aos trancos e barrancos, tendo, inclusive,
quando recomeçava, que retornar algumas páginas para me situar na história.
E Mia Couto é um dos maiores escritores da nossa época. Cada capítulo que
lia era como se fosse uma aula de escrita e criatividade. O tema é um defunto
que não está lá bem morto. Que está morto de alguma forma, mas é capaz de
falar e engravidar uma jovem. E, assim, vai o enredo, contando a história de
uma família. Uma metáfora das relações de um lugar. Divertido, inclusive.
No Encontro Fluminense de Escritores, Delmo Ferreira, o Presidente da
Academia Teresopolitana de Letras, enfatizou que o leitor consegue, ao ler um
livro, identificar as fontes das quais o autor se alimentou.
Esta premissa é verdadeira demais.
A história de Mia Couto é uma mentira que ele pretende que seja
verdadeira aos olhos do leitor. Seu texto é um belíssimo devaneio bem
contado, e ele nos deixa transparecer os caminhos que vivenciou. Ah, o nosso
Mia, conhece Fernando Pessoa e Machado de Assis. Até porque Fernando
Pessoa mostrava Machado de Assis em suas linhas. E, aí, esta história tem
meandros de Camões. De Shakespeare, inclusive.
O nosso Vinícius era também um grande viajante pelos bosques da
literatura. Dizem as sábias línguas que ele chegou a saborear os versos da
ilíada. Um grande escritor não pode prescindir de Ulisses, de James Joice, nem
de Miguel de Cervantes. Muito menos de Lewis Carol. Ah, a bela Alice... Não é
uma personagem efêmera.
Termino esta coluna, deixando uma frase do livro para pensarmos
baixinho, no canto do nosso travesseiro. Em segredo.
Nenhuma pessoa é só uma vida. Nenhum lugar é apenas um lugar. Aqui,
tudo são moradias de espíritos, revelações de ocultos seres. E eu despertara antigos fantasmas.
Tereza Cristina Malcher Campitelli
Momentos Literários
Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.
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