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I Ching, o extraordinário e sábio livro das mutações
Ao buscar um assunto para escrever esta coluna, vou confessar, descobri que o livro que mais li na vida foi o I Ching, o livro das mutações. O primeiro contato que tive com ele foi há mais de quarenta anos. Quando meu filho nasceu, tinha e tenho uma amiga, a Ana Teresa, que teve, na mesma época, um menino, que me colocou o livro nas mãos. Durante o tempo em que passávamos juntas com nossos bebês, líamos, folheávamos as páginas, jogávamos as moedas e tentávamos interpretar os significados dos ideogramas. Desde então, nunca dele me separei. É um livro extraordinariamente sábio e de hábil inteligência a respeito das tendências do movimento da vida e seus acontecimentos. Até hoje, sempre que tenho que tomar uma decisão ou estou passando por alguma dificuldade, eu busco no I Ching respostas. E sempre as encontro. O oráculo, segundo a tradição chinesa, nunca falha.
Será o I Ching uma obra que possa ser considerada literária? Eu afirmo que sim, apesar de não ser mestre das letras. Primeiramente, porque sobreviveu ao tempo e a todas as mutações do mundo, desde o seu surgimento, na China, em período anterior à dinastia Chou; 1.150 a 249 a.C. É um dos livros mais antigos da humanidade. Permaneceu vivo nas culturas orientais e ocidentais há mais de 3.170 anos. É um livro de rara complexidade e de riqueza de valores, cuja sabedoria influenciou o desenvolvimento da civilização chinesa, através de um texto denso de ideias e conteúdo simbólico. É preciso estudá-lo com minúcia para entender as mensagens, a começar pelo seu nome, o Livro da Mutações. No pensamento chinês, o nome é uma palavra ou expressão que desvela ou que se deixa ver o que designa, não é apenas um rótulo. Segundo Confúcio, a harmonia do mundo depende da retificação dos nomes. Desta forma, a ideia de mutação significa mudança na sequência dos fatos, que contém o fator central da visão que se faz do mundo que possui um fluir contínuo, do qual nada escapa. Não basta falar de mutação, há que se compreendê-la; os modos e as fases através das quais ela acontece.
O mundo é mutável, entretanto, a mutação é invariável, onipresente e absoluta na medida em que modifica o estado das circunstâncias; na essência de cada fato, há tendências opostas em movimento. Nada é estático.
O livro descreve, através de palavras, o significado de sessenta e quatro estruturas, que podem ter sido, pelo menos parte delas, escritas por Confúcio. De todo o modo, o pensamento de Confúcio influenciou grande parte delas.
Este Livro tem sido utilizado como um oráculo desde a Antiguidade. Mas não é um oráculo apenas, é um livro de leitura e pesquisa, através das quais o leitor poderá ter contato com uma sabedoria extraordinária. O uso oracular pode ser considerado uma fase de leitura inicial do livro, fase para quem ainda não consegue aplicar, à sua vida, os princípios apresentados pelos hexagramas, nem correspondê-los com os fatos. Mesmo sendo suas palavras claras e precisas, o entendimento humano é turvo e confuso. O oráculo mostra o que é, entretanto pode não se conseguir ver o que ele mostra porque não se quer ou não se sabe ver.
O Mestre disse: Não há regra fixa para a ascensão e a queda. Deve-se apenas evitar fazer o mal. A perseverança constante não rege o progresso ou o retrocesso; só não se deve deixar afastar-se da sua essência. O homem superior estimula o seu caráter e trabalha em sua obra, para que em tudo se realize no momento adequado. Por isso ele não comete erros.
Tereza Cristina Malcher Campitelli
Momentos Literários
Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.
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