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Um monumento à bestialidade humana
quarta-feira, 02 de outubro de 2013
De Varsóvia fomos para Przmesyl, cidade mais próxima de Belzec, quase na fronteira com a Ucrânia. Quando meu avô nasceu, ela estava anexada à Rússia, em função da divisão da Polônia e essa era a cidade da família Wolosker. Aliás, é muito estranho chegar num lugar, origem da sua família, sabendo que não existe mais ninguém lá, pois todos foram sacrificados pelos nazistas. A sensação de vazio é grande.
Belzec é um lugarejo cujo único atrativo é um monumento à estupidez e à bestialidade humana, a provar que o bicho-homem só é racional por ter cérebro, mas comporta-se de maneira mais irracional do que qualquer fera, pois até estas só matam os da própria raça em condições especiais.
Em 20 de janeiro de 1942, na conferência de Wannsee, foram revelados os planos da solução final (o extermínio dos judeus da Europa), por Reinhard Heydrich. O campo de Belzec foi construído para matar os semitas da região de Lublin e, mais tarde, de outros lugares do GG (General Gouvernement), que incluía a Polônia e os países ocupados pela Alemanha nazista.
Ao contrário de Dachau, Treblinka e outros onde os mais jovens e os mais sadios eram separados para trabalho escravo, ou seja, morte à prestação, Belzec foi construído exclusivamente para matar. Quem ali entrava não saía vivo, era um campo de morte. Há relato de um único sobrevivente apenas, Deus sabe lá como.
As primeiras experiências de assassinato começaram em fevereiro de 1942, sendo usada a eletrocussão, logo substituída pelas câmaras de gás. No entanto, para se livrarem dos cadáveres, os alemães escolheram a cremação com óleo e durante meses, toda a área tinha uma espécie de névoa pesada, por causa da combustão. Os habitantes locais tinham que raspar a gordura humana que se acumulava nas suas janelas. Cerca de 436.000 judeus foram sacrificados, mas o total de mortos ultrapassa os 500 mil, pois poloneses não judeus, ciganos e outras "sub-raças” que não a ariana idealizada pelo Reich contribuíram para aumentar essa cifra macabra. O mais impressionante é o fato de o campo ter encerrado seus "trabalhos” em dezembro de 1942. Em dez meses os nazistas liquidaram duas e meia vezes a população da Nova Friburgo de hoje, cerca de 50 mil pessoas por mês.
A única construção atual no campo de Belzec é a do museu, pois todo o resto foi demolido. Ficou fechado durante muitos anos só sendo aberto à visitação nos anos 90. Na parte de trás desse campo da morte tem um muro com o nome dos muito judeus ali sacrificados e foi onde localizei o nome de minha bisavó e de alguns tios e tias avós. Na realidade, toda a família Wolosker que morava na Polônia teve seu fim nesse triste lugar. Nesse muro fiz uma prece pelos meus e pela morte inútil de tanta gente, além de orar, se isso é possível, pelo fim da insensatez humana.
A cidade paga um tributo ao seu passado de matadouro de seres humanos, pois parou no tempo e no espaço, no entanto, o campo em si, apesar de sua história trágica, consegue transmitir um sentimento de paz, em função do vazio que lá existe. Ao contrario de Dachau e outros, Belzec não exibe fotos, nem a reconstituição das câmaras de gás, apenas uma maquete de como era o campo.
Apesar de termos feito uma viagem cansativa, atravessando quase toda a Polônia, meu esforço não foi em vão, pois prestei uma homenagem aos meus que se foram tão cedo, pois a maioria tinha menos de 50 anos, além de muitas crianças. Essa parte da história da humanidade, por mais macabra que seja, tem de ser passada e repassada aos jovens, para que outro lunático como Adolf Hitler jamais tenha campo para repetir tais atrocidades.
Max Wolosker
Max Wolosker
Economia, saúde, política, turismo, cultura, futebol. Essa é a miscelânea da coluna semanal de Max Wolosker, médico e jornalista, sobre tudo e sobre todos, doa a quem doer.
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