O STF na contramão da história

sexta-feira, 06 de abril de 2012

Causou perplexidade a diretriz assumida pelo STF de só considerar como prova de embriaguez, no trânsito, os resultados oriundos do bafômetro e da quantidade de álcool no sangue. Nessa medida anulou a comprovação clínica, advinda de sinais externos de consumo excessivo de álcool, tais como fala pastosa e arrastada, diminuição dos reflexos, marcha oscilante, coordenação motora prejudicada, prolixidade e agressividade ou depressão.

Tal orientação causa um grande mal-estar, na medida em que vai na contramão da história, pois as estatísticas são unânimes em apontar a instalação da Lei Seca como um fator importante na diminuição dos acidentes de trânsito, principalmente nos fins de semana, e o que é o mais importante, a redução da mortalidade causada por esta irresponsabilidade que é dirigir bêbado ou com um nível mais alto que o permitido pela lei. No momento em que as autoridades pensam em endurecer ainda mais, baixando a tolerabilidade da alcoolemia a zero, ao contrário dos 0,8 miligramas por mililitro de hoje, o STF toma uma atitude no mínimo esdrúxula.

Se pelo caolho código penal brasileiro uma pessoa pode se recusar a soprar o bafômetro ou a colher uma amostra de sangue, na suposição de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo, e se a simples observação ou exame clínico são colocados em cheque, todo um trabalho desenvolvido em prol de aumentar a segurança no trânsito ameaça de se perder. Pode-se alegar que a comprovação do estado de embriaguez, do ponto de vista clínico, está sujeita a erros, mas na grande maioria dos casos, um “bebum” é inconfundível. Os membros do STF parecem acompanhar a medicina de hoje quando se examina menos e a avaliação clínica, ferramenta mais importante no ato médico, fica em segundo plano. A diferença é que enquanto na medicina atual, para compensar, a solicitação de exames atinge níveis excessivos, no caso do STF ficamos com as mãos e os pés atados caso o possível infrator se negue a fazer os exames.

O que não se pode negar é a diminuição importante com a implantação da lei seca, de acidentes com vítimas, sejam fatais ou com as terríveis sequelas de traumatismos cranianos ou de coluna e os consequentes casos de invalidez parcial ou permanente causados pelo mortal casamento de direção e excesso de álcool. É preciso que o motorista tenha em mente o perigo que é dirigir alcoolizado e está mais do que provado ser a multa e a suspensão da permissão de dirigir a melhor maneira corretiva para essa transgressão. A punição financeira, infelizmente, é a mais eficaz. No entanto, se a caracterização do estado de embriaguez começa a ser dificultada, a tendência será o aumento gradativo dos acidentes de trânsito com vítimas.

É preciso ter em mente que as instituições têm obrigação de aprimorar o seu nível de atuação, mas nem sempre tais medidas devem ser tomadas ao pé da letra. Se a simples observação deixa de ter valor e se o possível infrator se nega a fazer exames, como chegaremos à verdade? E isso passa a ser válido em qualquer situação. Assim, se uma pessoa acusada de ter atirado e matado um semelhante se recusar a fazer o teste do resíduo de pólvora nas mãos, e se isso for uma prova importante, como ficaremos?

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Max Wolosker

Max Wolosker

Economia, saúde, política, turismo, cultura, futebol. Essa é a miscelânea da coluna semanal de Max Wolosker, médico e jornalista, sobre tudo e sobre todos, doa a quem doer.

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