O início do fim de uma atividade proveitosa

terça-feira, 11 de novembro de 2014

O fim do ano se aproxima, 2014 está nos seus estertores, é o momento ideal para reflexões e tomada de decisões com o objetivo de seguir em frente. Na realidade, planejamento é a palavra correta e mais do que necessária, para que tenhamos êxito nas nossas pretensões. Lógico que sempre vamos nos deparar com os imprevistos, mas isso é típico do imponderável, do próprio existir do ser humano.

Assim, começo a me despedir da minha profissão de médico, aquela que exerci por mais de quarenta anos. Uma carreira difícil, que exige do profissional tempo, paciência e muita dedicação, sem falar que na maioria das vezes é muito mal remunerada. Isso é público e notório no serviço público, onde presidentes da república, governadores e prefeitos querem resolver os problemas de saúde normalmente com promessas pré-eleitorais, sem em contrapartida pagarem bons salários aos médicos. Para os secretários, na grande maioria, seus apaniguados, o céu; para os esculápios, o inferno. Mas, bem feito para o povão, que continua a acreditar nesses ilusionistas e nas suas mais insanas promessas. Aliás, uma pergunta que não quer calar: UPA ao lado de um CTU? Por que não em Olaria, com o Sase desativado, o que contribuiria para descentralizar e aliviar a sobrecarga do Hospital Raul Sertã? Ou seria para tentar, do casamento dos dois, uma prole de Upinhas e CTUzinhos?

Desses quarenta anos, trinta e oito o foram em Friburgo, para onde me mudei com a cara e a coragem, no longínquo ano de 1977; naquela época, a cidade era muito mais provinciana que a atual, e a primeira pergunta que te faziam, ao ser apresentado a alguém, era o indefectível "O senhor é de que família?”. Portanto, o início não foi fácil e somente com muita persistência, capacidade profissional e perseverança consegui vencer e estou prestes a concluir mais um ciclo da minha vida. Aliás, sem uma ponta de cinismo, afirmo que nenhum "estrangeiro” sobrevive incólume aos preconceitos da "Suíça brasileira”.

 Entre meus pacientes (naqueles tempos longínquos podíamos chamá-los de meus pacientes, hoje eles o são dos planos de saúde), fiz muitos amigos e tenho muitos casos que poderiam dar origem a um livro; uns trágicos, outros dramáticos e alguns interessantes que mostram a confiança que as pessoas depositavam no "seu médico”, mesmo que o ato fosse uma verdadeira loucura. Nunca me esqueço do dia em que recebi o telefonema de uma mãe muito preocupada com a glicemia de ponta de dedo do seu filho, muito elevada e muito próxima do coma. Mesmo sem a sofisticação dos aparelhos de hoje, podia-se acreditar no resultado daquelas fitas. A minha sugestão foi a de que a criança fosse internada, pois me encontrava ausente da cidade. Pois bem, a mãe retrucou: "Sem o senhor presente nada de internação, me dê as instruções pelo telefone que eu sigo e assumo”. E, correndo todos os riscos, embarquei nessa loucura junto com ela; com telefonemas (não existiam ainda os celulares) a cada três horas, após um intervalo de dez horas a glicemia havia baixado para 200 mg/dl e o risco de um coma diabético afastado por completo. Isso não está nos compêndios e sim na experiência, vivência e coragem dos profissionais de saúde. Claro está que ela, já falecida, era muito inteligente e, apesar de leiga, irmã de médico.

Mas, como continuar é preciso, seguirei escrevendo minha coluna semanal e continuando a fazer o que já virou rotina na minha vida, ou seja, viajar. Esse ato une aplacar a sede do conhecer, contribui para aumentar a bagagem cultural e é ótimo para nos sentirmos bem. Une o útil ao agradável. 


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Max Wolosker

Max Wolosker

Economia, saúde, política, turismo, cultura, futebol. Essa é a miscelânea da coluna semanal de Max Wolosker, médico e jornalista, sobre tudo e sobre todos, doa a quem doer.

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