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O aniversário de mamãe
Deixando de lado o que aprendemos na faculdade de jornalismo, quando nos é ensinado que não devemos divulgar notícias que digam respeito ao nosso próprio cotidiano, que fazem parte do nosso universo particular, abro uma exceção para a viagem que fiz a Campos do Jordão-SP, neste feriado de 1º de maio.
Apesar da cidade ter um charme especial, proporcionar aos turistas momentos muito agradáveis, nossa estadia nessa estância paulista deveu-se ao fato de cumprir um desejo de minha mãe, que gostaria de comemorar seu aniversário, no dia do trabalho, curtindo o frio da serra da Mantiqueira. Aliás, não se trata de uma data natalícia qualquer, já que ela completou 94 anos. O mais curioso é o fato de ter deixado bem claro, para que não houvesse dúvidas quanto ao seu desejo, que essa seria a última viagem de sua vida. O recado estava implícito, quer dizer vocês no, caso eu e minha irmã, não vão me negar meu último pedido.
Para uma senhora, que há exatos 12 meses, sofreu um enfarte que deixou inativo a metade do seu coração, era um desejo “de peito”, o que exigiu de nossa parte uma verdadeira operação de guerra. Afinal das contas trata-se de um trajeto de 474 quilômetros (de Cabo Frio, onde ela mora, até nosso destino final) em mais ou menos oito horas de carro, o que nos fez optar por um pernoite em Resende, cidade que fica na metade do trajeto.
O hotel, necessariamente tinha de ter uma portaria no térreo e ser dotado de elevador, já que rampas ou escadas estão banidas, por completo, da vida de minha mãe. Teria de ser também nas proximidades de restaurantes e do comércio local, de maneira que ela pudesse ter acesso a pé, sem se cansar. Isso não foi difícil, pois no bairro Vila do Capivari está a maior parte dos hotéis de Campos do Jordão, todos próximos da Praça do Capivari. Além disso, um passeio pelo trem que corta a cidade de ponta a ponta não seria difícil, pois o ponto de partida é nas proximidades dessa mesma praça.
A cidade serrana paulista, diga-se de passagem, a mais alta do Brasil com 1.628 metros de altitude, estava cheia não só pelo feriado, mas pelas comemorações dos 144 anos de sua fundação, que se deu em 29 de abril de 1874. Dos vários eventos programados, estendendo-se de 23 de abril até o último dia 1º, destaca-se a tradicional Festa do Pinhão, na sua 57ª edição e é a mais badalada.
Encontrado com abundância na região montanhosa da Serra da Mantiqueira, o pinhão é parte importante da cultura e gastronomia de Campos do Jordão; proveniente das exuberantes árvores – de espécie fêmea – chamadas Araucárias, ele é facilmente encontrado em diversos locais da cidade e áreas vizinhas. Sua colheita acontece naturalmente nos período de abril a junho, quando as sementes se soltam das pinhas maduras e caem no solo. Ameaçada de extinção a araucária angustifólia é um pinheiro que também aparece frequentemente na região sul do Brasil, em especial nos locais mais frios. Tanto é assim, que na cidade de Lages, em Santa Catarina, também acontece a mesma festa, somente que há menos tempo, pois a primeira data da década de 1980.
Como não poderia deixar de ser, a estrela maior do evento é a pinha servida em pratos salgados, doces e alcoólicos, pois dessa fruta se fabrica um quentão de primeira qualidade. Campos do Jordão é bem mais fria do que Nova Friburgo, mas nessa época do ano, as temperaturas são idênticas com madrugadas frias, oscilando entre 8 e 10 graus e 25 graus durante o dia, sendo que no sol, pode chegar a 30. Isso foi bom, pois os idosos em geral e minha mãe, em particular, são muito friorentos. Lógico que queremos que ela viva bem mais, mas voltaremos para casa com a sensação que fizemos, pelo menos no momento, sua última vontade.
Max Wolosker
Max Wolosker
Economia, saúde, política, turismo, cultura, futebol. Essa é a miscelânea da coluna semanal de Max Wolosker, médico e jornalista, sobre tudo e sobre todos, doa a quem doer.
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