Colunas
Mal de Alzheimer, um flagelo que degrada e aniquila o ser humano
quarta-feira, 16 de abril de 2014
Segunda-feira fui ao Rio para dar um parecer sobre uma senhora de 69 anos e que sofre do mal de Alzheimer há oito anos. Em função de uma pneumonia e de uma diarreia que a desidratou muito rápido, teve de ser internada num hospital na Tijuca, onde permaneceu durante três meses, dos quais um bom tempo no CTI.
Por causa dessa internação prolongada e de não ter sido movimentada no leito de maneira adequada, surgiu uma escara na região lombar baixa, próxima às nádegas, com tamanho e profundidade que vão requerer tratamento cirúrgico. A minha presença se deveu a fazer um relatório a ser enviado à Justiça, para que o plano de saúde cumpra na íntegra a cláusula de seu contrato, que lhe garante um tratamento domiciliar, para que os curativos e outras medidas de apoio sejam ministrados por profissionais treinados, da área de saúde, com o fornecimento do material a ser utilizado.
Conheço a paciente de longa data, portanto, bem antes dos primeiros sintomas do Alzheimer, e a revi, agora, quando a doença está em fase avançada. Sua sintomatologia foi a clássica, alternando períodos de esquecimento e de funcionamento normal do intelecto; dos movimentos repetitivos à exaustão, como subir e descer escadas sem parar e sem objetivos definidos; o consumo exagerado de determinados alimentos, a fase de agressividade para com os familiares mais próximos. Agora ela está naquela fase de alheamento total do ambiente em que vive, alimentando-se com muita dificuldade e falando coisas desconexas e incompreensíveis mesmo, além de total incontinência urinária e fecal que a obrigam a usar fraldas dia e noite.
De causas ainda desconhecidas e sem tratamento adequado que efetivamente traga melhoras ou, pelo menos, estabilize a escalada rumo à perda total da conexão com o mundo, essa doença é um flagelo de grandes proporções. Afeta pacientes e parentes, de maneira marcante e definitiva.
Para mim, foi um choque terrível (e nesses meus 40 anos de formado em Medicina já presenciei muitas tragédias), um verdadeiro encontro com o aniquilamento de um ser humano, com sua degradação como indivíduo, da sua transformação num verdadeiro vegetal, sem nenhuma perspectiva de recuperação, numa dependência total dos que o cercam, sob o risco de morrer sujo e desnutrido se essa ajuda lhes faltar ou for negada.
Aquela senhora que conheci, que trabalhou a vida inteira até se aposentar, como assistente social, vascaína de coração, culta e inteligente, jazia sobre o leito de um quarto de hotel destinado às pessoas da terceira idade, completamente desconectada do mundo em que vive, um vegetal amarelado e quase sem vida, cujo desfecho será mesmo o fim de um sofrimento.
Terá a ciência condições, um dia, de diagnosticar de maneira precoce e tratar adequadamente o Mal de Alzheimer? Terá a ciência condições de prevenir essa doença que tanto desfigura e degrada o ser humano?
Max Wolosker
Max Wolosker
Economia, saúde, política, turismo, cultura, futebol. Essa é a miscelânea da coluna semanal de Max Wolosker, médico e jornalista, sobre tudo e sobre todos, doa a quem doer.
A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.
Deixe o seu comentário