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Vai querer o quê?!
quarta-feira, 06 de agosto de 2014
Cada vez mais o mundo cria novos produtos e opções para que a gente possa substituir o existente por outro, gerando novas necessidades e novos desejos. Novo, novíssimo, mega novo — e nesta velha estratégia de novidades, nossas escolhas estão se tornando cada vez mais confusas.
Todos os anos, milhares de produtos são lançados no Brasil, e mais de 80% deles fracassam. São produtos de empresas pequenas e grandes. Falhas de concepção, de adequação, de distribuição, de precificação, de timing ou simplesmente de cor, tudo é motivo. Apesar do mercado adorar o novo, ele também trata com grande superficialidade e distância.
Nos corredores dos supermercados o que vemos são produtos em sua maioria tradicionais, sob a ditadura do varejo que não tem tempo de esperar um novo produto amadurecer e gerar resposta significativa de venda. Nestes mesmos corredores, circulam consumidores que adoram novidade, mas detestam se arriscar. Adoram o diferente, mas têm muito medo do que é desconhecido. É como entrar numa montanha russa e manter os olhos fechados. É bom, mas é ruim.
Essa condição onde os consumidores têm fome de novidade e vivem em regime de restrição ao risco, as indústrias vivem gerando grande oferta de produtos que morrem antes de mostrar a que vieram, e a mesma indústria transfere a conta para nós, consumidores, através de seus produtos tradicionais e estabelecidos.
Outro fenômeno do consumo, mas que já começa a retrair, é o excesso de oferta de produtos semelhantes. O marketing, no desespero de atender a segmentação, apresenta muitas opções. São tantas que o processo de escolha se torna sofrido e muito, muito difícil.
Comprar um simples xampu ou batata frita virou uma tarefa que precisa ser definida antes. Recomenda-se prudência, porque prostrar-se frente à gôndola do supermercado sem ter isso definido com antecedência e determinação torna a escolha muito demorada. Isso acontece porque enquanto você só tem uma chance de acertar, você tem oito, dez, doze de errar.
A batata tem sabor churrasco, salsa e cebola, rúcula com amendoim, abóbora com mel, entre outros tantos. O que falar do xampu? Cabelos secos, oleosos, tratados quimicamente, com franja, de chapinha, com percevejo, pro lado, pro outro lado e por aí vai. Deve ser por isso que tem tanto homem careca, chega de escolher xampu! As escolhas mais óbvias, como o sabor batata e para quem tem cabelo na cabeça, não se acha mais?!
Entre os muitos lançamentos e o excesso de escolhas, parece que o consumidor não consegue ser tão ousado quanto se imaginava. Nosso processo de sofrimento em tomar decisão ainda está ligado ao nosso ser primitivo, que temia mudar seus hábitos e ser devorado por um tigre ou perder-se na floresta. Submeter o cliente a escolhas demais vem se mostrando pouco eficiente, pois nossa mente não avalia apenas a chance de acertar, mas principalmente as de perder. Nossa querência infantil, aquela que faz a criança dizer: compra, compra, eu quero e quero essa também, está latente dentro de nós e tantas escolhas nos levam a temer o que estamos abrindo mão ao escolher apenas uma. Medo capaz de adiar a escolha pelo novo também.
Na próxima ida a um ponto de venda, repare nos seus sentimentos. É ótimo ver novidade, mas é desconfortável escolhê-la. É ótimo ter escolhas de cor, sabor, modelo, mas quando isso cresce demais e, principalmente, se sobrepõe, o processo se torna até doloroso. O varejo precisa ofertar escolhas, mas não pode confundir. Ele precisa direcionar e agilizar tal processo, dando ao consumidor o direito de escolha, mas respeitando seus limites e dificuldades de ler um imenso cardápio de possibilidades.
Na pizzaria quase sempre pedimos meio a meio, maneira simples de escolher mais possibilidades, mas quanto maior o cardápio, mais demorado o pedido. Após a escolha não raramente fica um arrependimento, por vezes apelamos para o sabor de sempre, isso quando não pedimos uma mussarela. Como somos complicados, não!? E você, vai querer o quê?
Roberto Mendes é publicitário, especialista em marketing pelo Instituto de
Administração e Gerência da PUC-Rio, pós-graduado em Engenharia Ambiental,
professor titular da Universidade Candido Mendes e sócio da Target Comunicação
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